Foto:walnize Carvalho
A Natureza e a mulher
Walnize Carvalho
Manhã de segunda-feira.
O dia mesmo de sol e frio dá sinais de que quem não quer sair de cartaz é o inverno.
Desço do apartamento e saio à rua. Passo, como de costume, pela Aquidaban, onde morei tantos anos e agora a casa é moradia dos filhos.
Na rua deserta enxergo ao longe o solitário ipê e exclamo: - Nossa, o “ipê de Conceição” floriu de novo! Este ano já é a terceira vez! - Mas, desta feita, já estamos batendo à porta a primavera - balbucio.
A árvore fica em frente à casa de minha amiga Conceição, de quem fui vizinha durante um bom tempo. Sempre que temos a oportunidade de nos encontrar, saudamos com afetuoso “bom-dia” e trocamos amabilidades, quase sempre em torno da Natureza.
Apesar da temperatura, fico ali por alguns minutos a observar o esplendor do pé florido, que reina absoluto.
A copa da árvore de douradas flores ilumina a manhã, ainda que nublada.
Mesmo tendo o seu lenho bem resistente, o ipê se vê acariciado pelo sopro do vento e se deixa despojar cobrindo toda a calçada com um belo tapete amarelo.
Paro um pouco em contemplação e fico a meditar: Não foi puro, creio eu, que Deus ao criar a Natureza, batizou-a com nome feminino: NATUREZA.
Bela, quase sempre. Silenciosa, às vezes. Generosa, outras tantas. Caprichosa, quando quer. Exibicionista. Determinada. Habilidosa. Espontânea. Contraditória. Versátil. Dócil. Rebelde. Voluptuosa.
Foi assim que lembrei, ao passar em outra tarde chuvosa de inverno, pela BeiraValão e vi destacando-se entre os ipês floridos, uma imensa árvore coberta de dourados brilhos.
Como uma bela e desejada mulher, ali se fazia presente, contrariando seu tempo de florescer (primavera). Com pujança dava um show de exibicionismo com tempo marcado para “retirar-se de cena” e usar trajes comuns - a Natureza/mulher e sua suntuosidade...
E continuei divagando: quantas espécies habitam o Universo (rios, mares, florestas, pássaros, animais, rochedos, cachoeiras etc ...) seguindo a ordem natural estabelecida, muitas vezes apresentam espetáculos diários sem o olhar do Homem? - a Natureza/mulher e sua espontaneidade...
Sigo a caminhada. Mais adiante me dou conta de que também há catástrofes, secas, enchentes, devastações de rios e mares - a Natureza/mulher e sua intempestividade.
O pensamento gira. E quando nas redes dos pescadores vêm saltitando sortimento de peixes e crustáceos? - a Natureza/mulher e sua generosidade.
Sou levada a pensar nas mudanças climáticas quando, de repente, um dia de inverno se faz verão e vice versa - a Natureza /mulher e sua extemporaneidade.
Paro o trajeto. A chuva cessa. O sol aparece por entre as nuvens. No céu desenha-se um portentoso arco-íris. - a Natureza/mulher e sua versatilidade.
Retorno dos compromissos agendados para aquela manhã, usando o mesmo trajeto de ida. Percebo que o solitário ipê está quase desnudado, apenas restando em seus galhos uma única flor.
O espetáculo natural se encerra sem plateia até a próxima florada, dando provas de que a primavera também fez o seu registro antecipado.
Corro os olhos ao redor.
Avisto o sol por entre as folhagens da palmeira, que adorna a calçada de outro vizinho. Apesar de sua timidez o astro rei também quer entrar em cena.
Chego introspectiva à minha residência. E a ideia inicial me domina: de todas as nuances dadas pelo o Criador, a Beleza sempre está presente. A mulher. A Natureza e a perplexidade.