sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Com jeito de mulher




Walnize Carvalho

Não foi puro, creio eu, que Deus ao criá-la batizou-a com nome feminino: NATUREZA.
Bela, quase sempre. Silenciosa, às vezes. Generosa, outras tantas. Caprichosa, quando quer. Exibicionista. Determinada. Habilidosa. Espontânea. Contraditória. Versátil. Dócil. Rebelde. Voluptuosa.
Foi assim que pensei, ao passar naquela tarde chuvosa de inverno, pela BeiraValão e vi destacando-se entre os ipês floridos, uma imensa árvore coberta de dourados brilhos.
Como uma bela e desejada mulher, ali se fazia presente, contrariando seu tempo de florescer (primavera). Com pujança dava um show de exibicionismo com tempo marcado para “retirar-se de cena” e usar trajes comuns.
A Natureza e sua suntuosidade.
E continuei meditando: quantas espécies habitam o Universo (rios, mares, florestas, pássaros, cachoeiras, etc. ...) seguindo a ordem natural estabelecida, muitas vezes apresentam espetáculos diários sem o olhar do Homem?!?...
A Natureza e sua espontaneidade.
Sigo a caminhada. Mais adiante reflito: e as catástrofes, as devastações dos rios e mares?!?...
A Natureza e sua agressividade.
O pensamento gira: e quando nas redes dos pescadores vêm saltitando sortimento de peixes e crustáceos?!?...
A Natureza e sua generosidade.
Paro o trajeto. A chuva cessa. O sol aparece por entre as nuvens. No céu desenha-se um portentoso arco-íris.
A Natureza e sua versatilidade.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Devaneio


Devaneio

Walnize Carvalho

Imaginem se pudéssemos chegar ao balcão de uma loja pedindo: - Embrulhe em papel de presente (o mais vistoso) uma caixa recheada de Paz. Ou se ligássemos para um hortifruti solicitando: - Separe duas dúzias (bem fresquinhas) de Harmonia e traga no endereço tal. Ou se fizéssemos (via Internet) uma encomenda urgente de três pacotes de Felicidade?!? No mínimo, significaria devaneio ou surto de loucura! Mas se somos todos “loucos” por esta trilogia ( paz, harmonia e felicidade ) seria uma conquista e tanto. Seria?
Convenhamos, que se nos fartássemos de tais iguarias em tamanha proporção estaríamos fadados à indigestão, tamanho peso no estômago e que antiácido algum daria jeito.
A escolha sensata é a de sempre saborearmos desses doces sentimentos enumerados, em porções balanceadas e, se possível, mescladas com amargos sabores (Dor, Tristeza e Saudade) o que torna a refeição – digamos assim – agridoce.
Se pensarmos bem, concluiremos que a vida nos oferece um banquete de cardápio variado. Só nos resta optar pelo “prato” a ser digerido.
À cada dia, desde o café da manhã pesamos na balança do bom senso nossas decisões. Devemos observar com cautela, qual o caminho a seguir: ou renunciamos a um projeto tão sonhado ou persistimos nele até que se concretize.
Muitas vezes, por açodamento, procuramos o caminho mais curto, mas que nem sempre nos leva a lugar algum.
De outra feita, somos tomados por forte indecisão. É como que chegássemos a um self service; parássemos diante de variada gastronomia e nos indagamos: feijoada ou massa?...
No “bate e rebate” do cotidiano estamos para perder ou ganhar; lutar ou resignar; nos reprimir ou nos libertar.Não é esta a receita de um bem viver?
Há dias em que o choro nos lava a alma. Em contrapartida, há momentos em que o nosso riso em excesso revela uma falsa euforia.
Repetimos à exaustão: “Todos temos o direito de ir e vir”. Mas sabemos sempre quando ir ou quando vir?...
Será que avaliamos com precisão quando é a Razão ou o Coração que deve falar mais alto? ...
São estas indagações que dão tempero a nossa vida. Concordam?
Retomo ao devaneio do início da crônica: ter por inteiro a Paz, a Harmonia e a Felicidade.Pura ilusão! Elas nos são servidas em fatias!...
O interessante é nestes momentos cada um de nós: apaziguar o coração, harmonizar o espírito e se felicitar com os consagrados versos : “Felicidade...Esta árvore milagrosa que supomos/ arriada de dourados pomos/ existe sim,/ mas nós não a alcançamos/ porque está sempre onde a pomos/ e nunca pomos onde nós estamos”.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Conto de Jardim: Equinócio

Aquela manhã de setembro estava insuportável. Desde que voltara ao trabalho, sócia numa pequena empresa, as sextas-feiras eram um tormento.
Dois dos colegas nunca se entendiam e perdiam um tempo enorme tentando provar que estavam certos, ela tão sonhadora na vida pessoal era extremamente prática no trabalho e se via sempre forçada a tomar as rédeas da situação.
Enquanto brigavam ela com uma enorme dor de cabeça se esforçava para terminar os relatórios semanais e deixar pronta a pauta da nova semana.
Aviso do porteiro, encomenda para ela.
Começou a rasgar o papel na sala comum aos sócios, se deteve assim que viu o nome da loja na pequena caixa. Foi para a sala privada e sorriu quando terminou de abrir. Lingerie preta com renda francesa. Com certeza ele havia visto seus olhos cobiçando as peças quando passaram em frente à loja.
Vivem o doce desequilíbrio dos sentimentos intensos.Separam-se e juntam-se, perdem-se e acham-se.
Divagava sobre o seu amor em meio aquele caos de papéis e contas.
Som de mensagem. Um SMS: Te aguardo...agora!!
Deixa um bilhete na secretária e sai apressada.
Ele a recebe com um sorriso e um beijo demorado.
No carro as botas de montaria castanhas , uma cesta enorme, mala.
Ia ser "raptada" para a serra. As crianças estavam na casa dos tios, ele avisava.
Caixa de presente na mão, deixa o vento bater na cara.
Equilibram-se nas primaveras e outonos, quando as almas milagrosamente se fazem harmônicas.
Acordam junto com o sol e vão colher o dia. Andam agora a cultivar auroras.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

O bambolê amarelo


O bambolê amarelo
Walnize Carvalho

Dia da criança!...Tempo de lembranças da infância...
Bola. .Brinquedo. Presente. Passado. Bambolê.Um bambolê amarelo.
Assim foi que era tardinha. .
Pela rua do Mercado (Oliveira Botelho) que fica em frente à minha casa de infância, lá vinha ele(meu saudoso padrinho em minha direção. A novidade nas mãos.
E eu, a afilhada que tanto amava, naquele dia recebi o presente: o bambolê (brinquedo que naquela época era novidade )
Ainda é viva a lembrança.: A calçada da rua do Gás; as irmãs ; as meninas da vizinhança e, eu -dona do círculo dourado – administrava o empréstimo à garotada.
Alegria...Inocência... Reminiscências...
Guiada pelo sentimento abri o portão de casa e postei-me na calçada.
As lembranças rodam .Redemoínho.
Transformo–me na menina que fui : coloco as mãos na cintura.Fecho os olhos e giro...giro...giro.
Um bambolê imaginário circula em meu corpo uma imensa saudade da infância que se foi na roda da vida.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

O pulsar da cidade


O pulsar da cidade

Walnize Carvalho

Na banca de revistas,
Grupo de senhores
Filando
Leitura de jornais.

No umbral da janela,
Roda de pássaros
Disputando
Farelos de pão.

Na porta da igreja,
Cacho de velhinhas
Rezando
Oração matinal

No meio da praça
Conjunto de transeuntes
Ouvindo
Pregação do vendedor.

Na entrada da repartição,
Aglomerado de rapazes
Pleiteando
Emprego definitivo.

No meio do Calçadão
Homens comuns,
Executivos,
Comerciantes,
Várias classes sociais
Em torno do assunto da semana:
- Eleições em todo o país.

A cidade pulsa.