sábado, 31 de dezembro de 2011

FELIZ ANO... de novo


Walnize Carvalho

De novo, a falsa euforia...
De novo, o engarrafamento...
nas ruas
nas mesas
Alegria?!

De novo, o vestido branco.
De novo, papéis picados do Banco.

De novo, tilintar das taças.
De novo, o riso de graça.

De novo, praia cheia
- oferendas na areia.
De novo, o comer de uvas, lentilhas.
De novo, catador de latas vazias.

De novo....
De novo...
Novamente
A espera por bonança.
A E S P E R A N Ç A.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Visita natalina

Walnize Carvalho
Manhã de vinte e cinco de dezembro.
A menina não foi a primeira a se levantar, como de costume. Nem tão pouco a que procurou bem cedo seu presente no sapatinho ao lado da cama.
A mãe estranhou. Veio olhar. A garota ainda dormia.
Observou, que estava toda encolhidinha no canto da cama. Parecia sentir frio. - Como, se era verão?!...balbuciou, a zelosa senhora.
O instinto materno acusou, que provavelmente sonhava e que derramava um leve sorriso no canto dos lábios. Viu que os olhinhos andavam. Tremiam. Coisa própria de criança entregue ao sono.
As irmãs já haviam aberto seus presentes e nas poucas vezes em que podiam ir à rua – rua que passava o bonde bem rente a calçada - ( e a ocasião do Natal era uma delas) se preparavam para mostrar às colegas da vizinhança suas novas bonecas. Geralmente eram bonecas.
E ela, Nani... Nani? Nani era seu nome, porque demorava a se levantar, pois se foi a primeira a se deitar na véspera, tamanha a ansiedade pela chegada do Papai Noel?...
A menina acordou. Com ares de felicidade revelou aos pais, que naquela noite viu quando o Bom Velhinho chegou. Estava muito cansado, quando dela se aproximou. Aos pés de sua cama, sussurrou-lhe para que as irmãs não ouvissem: - Menininha, não conta para ninguém! Posso descansar aqui um pouquinho?
Ela permitiu. Encolheu-se para o canto e deixou que ele repousasse... Findo o mistério.

Olha, amados leitores! Talvez para uns, a história esteja incompleta; talvez para outros, Papai Noel não exista; talvez para alguns, o “sonho não acabou”e ,talvez para muitos esta singela historinha tenha servido de reflexão e saudade, da época da inocência ,a que nos transportam remotos natais.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Trajetória



Walnize Carvalho

De repente, formou-se um brilho –um fulgor.
E,aos poucos,daquele claridade algo nasceu.Algo brotou
Va- ga- ro – sa- men – te.
E ,de repente,
Foi crescendo...crescendo...se evoluindo
E, de travessa saiu correndo...correndo
Descendo medrosamente,
Escorregando rapidamente
Como se quisesse desabafar.
Como se quisesse gritar
Ou mesmo se encontrar
Fugir
E nessa trajetória
Continuou a correr.
Até que
Repentinamente
Caiu
Morreu
Desabafou
Se encontrou!...

Este foi o fim de uma lágrima teimosa que brotou de um olhar triste.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Travessura de mãe


Walnize Carvalho

A mulher percebeu do seu quarto que do cômodo ao lado vinha uma claridade. Caminhou até a sala.
Olhou com olhos preguiçosos de abrir, o relógio na parede: duas horas.
Atravessou o corredor.
A luminosidade que filtrava em toda casa vinha do quarto dos filhos.
Espiou, discretamente, pela abertura da porta.
Estavam dormindo. Janela aberta. O frescor da madrugada sobre suas faces.
Eles ali dormindo, displicentemente.
Ela os olhou com ternura.
Apagou a luz do abajur. Desligou o som.
De volta à sala procurou na estante o livro “Tantas Vozes” de Ferreira Gullar . Encontrou o poema “Filhos”.(*)
Enxugou a lágrima teimosa e, numa atitude pueril, buscou no fundo da gaveta do armário da cozinha uma lanterna.
Sorrateiramente entrou no quarto. Munida de luz e caneta “pilot” transcreveu os versos na porta clara.
Escreveu. Riu. Segurou a emoção para não escapar nem um ruído que fizesse os meninos acordarem .
Acabando o poema, suspirou pensando : como é bom se criança. Ser mãe. Ter os filhos que eu tenho!
Perdão filhos! Por ter brigado tantas vezes pelas garatujas que fizeram em criança!
Filhos
Ferreira Gullar

“ Daqui escutei
quando eles
chegaram rindo
e correndo
entraram
na sala
e logo
invadiram também
o escritório
(onde eu trabalhava)
num alvoroço
e rindo e correndo
se foram
com sua alegria
se foram
Só então
me perguntei
por que
não lhes dera
maior
atenção
se há tantos
e tantos
anos
não os via crianças
já que
agora
estão os três
com mais
de trinta anos.”

sábado, 26 de novembro de 2011

Tem que ser


Walnize Carvalho

Tem que ser
obediente
complacente
convincente

Tem que ser
crítica
apolítica
dogmática

Tem que ser
humorista
otimista
altruísta

Tem que ser
guerreira
pioneira
alvissareira

Tem que ser
antenada
plugada
conectada

Ah!
sociedade
controladora
dominadora
castradora

Sou
um
SER QUE TEM
despojamento
sentimento
e
no pensamento
uma enorme vontade de acertar ...

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Esperança na Arte



Walnize Carvalho

Sempre acreditei que a ARTE (assim como diz a letra de Caetano Veloso em “Desde que o samba é samba”) tem “o grande poder transformador”.
Somente ela revestida em música, pintura, dança, teatro... e – principalmente – em literatura consegue dar nova forma e sentido à vida.
Vez por outra, lê-se registros desta constatação – e, porque não dizer, inquietação – de articulistas, poetas, cronistas, e dos que lidam em geral com a palavra.
Bem se sabe que ela não atua como efeito bumerangue (bate e volta aos que escrevem), mas que corre como flecha ligeira em busca de corações desprotegidos.
Daí a importância de que a literatura tenha sempre um “palco” para se apresentar e de “platéia” que possa interagir com ela.
Por aqui se vê entidades, instituições, fundações, academias de letras, cafés literários, casas de cultura, salas de espetáculos, vários espaços em que ela “abre-alas e pede passagem” e encontra reciprocidade.
Mas... há de se querer mais!
Que ela visite mais escolas, universidades, blogs, canais de tevê, emissoras de rádio...
Particularmente, não tenho o que reclamar, pois (sem vaidade) aqui estou com meus textos que transitam livremente
É necessário que ela (mais uma vez, a literatura) faça piquete nas portas dos bancos; se infiltre em filas intermináveis de espera.
Seja sorvida entre bebidinhas e conversinhas nos points da cidade.
Torne leitura em ante-salas de consultórios médicos, odontológicos e de profissionais liberais substituindo, talvez, revistas de moda e de fofocas de artistas.
Que ela saia em passeatas pelas ruas sendo panfletada entre vendedores, comerciantes, consumidores, anônimos e curiosos.
Bata ponto nas rodas de café e seja assunto interessante entre grandes negócios feitos nas manhãs do Boulevard.
Brinque nas praças; visite presídios, orfanatos, templos e asilos. Que seja estampada em outdoors nas nossas esquinas.
Sem utopia. Dia virá em que “a arte de compor trabalhos artísticos em prosa e verso” – a literatura – será servida como prato principal aos que são famintos de transformação.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

História em quadrinhos


Walnize Carvalho
Manhã de sábado.
Ida ao shopping.
Entre pessoas apressadas, curiosas, mal-humoradas, com sacolas, com crianças, cenhos fechados, observadoras, casais de namorados... Ela passa, a mulher.
Observa o olhar faminto. Uns com fome de guloseimas, outros de consumos materiais.
E como o lugar é propício para diversão, lazer e prazer, flagra sorrisos de felicidade: da moça no balcão da loja olhando as fotos reveladas; da jovem na livraria recebendo um livro de presente; da menina comprando sorvete de três sabores; da senhora pesando na balança da farmácia.
E mais a alegria estampada no senhor sorvendo vagarosamente o café expresso; do menino jogando videogame; do rapaz assistindo esporte na tevê da loja; do idoso conferindo a tabela de promoção de remédios...
Continua andando.
Um “flash” a faz parar. Uma pessoa a observa.
Está diante de um espelho. A mulher e a escritora frente a frente completam os personagens da história em quadrinhos de uma revista diária.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Maria Alice e a morte

Maria Alice é a minha amiga mais próxima. Digo que nos conhecemos desde sempre. Tem uma rabugice única, um bom coração e é a mais passional das criaturas, o que pode ser muito ruim ou muito bom.

Minha amiga tem teorias singulares sobre várias coisas, a teoria sobre a morte e os fatos que a envolvem são de fazer rir.

Odeio gente que não sabe se comportar em velório. Velório é lugar de dor e não de contar piadas “para fazer esquecer o sofrimento” como os engraçadinhos inconvenientes apregoam.
Velório não é lugar para roupas coloridas, nem lugar para decotes. Eu já avisei: quem aparecer vestida de maneira inadequada no meu velório vai arcar com as consequências. Eu volto para puxar o pé na mesma noite.
Acho tão bonito uma viúva de luto. Hoje em dia esqueceram o luto. Acho o luto fundamental para a saúde emocional. Ele tem sua razão de ser. É momento de chorar, de coração dorido. Quem não vive o luto paga o preço em algum momento. E para isso um pretinho básico ajuda muito.
Detesto escândalo em velório. Choro verdadeiro não é escandaloso. Desmaios também me irritam. Quem sofre de verdade, chora, chora sem som, abraça os amigos, molha o rosto sempre que sente um nó na garganta. Gente que ameaça se jogar no túmulo para mim é sem educação e falsa. Quem sofre, apenas chora, chora muito. Se usar óculos escuros fica sem dúvida um choro beirando á perfeição.
Gosto de véus negros, pena que hoje quase ninguém usa chapéus com véu então... No velório do meu marido ameacei usar um chapéu, fui demovida da idéia. Usei meu véu negro e um terço. Chorei muito. Gosto de chorar.
Usei um mês de luto fechado e outros tantos de luto menos rigoroso. Vivi minha dor. Sobrevivi.

Essa é apenas a primeira das histórias da minha amiga, vou contar sempre que der vontade. Seu nome foi trocado por razões óbvias.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Explosões silenciosas



Walnize Carvalho



Céu estrelado em noite de luar...



Arco-íris em fim de tarde...



Gota de orvalho na folha...



Flores em beira de estrada asfaltada...



Marolas em rio vistas da ponte...



Pássaros em fios elétricos de postes...



Lágrima em olhar saudoso...

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Cercas


Walnize Carvalho


Andando pelas cercanias

da cidade

Vejo que

mais e mais

precisamos de cercas.

Da prisão de olhares

de ternura

Do contorno de abraços

de afeto

Da cercadura de gestos

de amor

Do muro de atitudes

de amizade.


E deixando

de ser

reféns de preconceitos.

Por certo

seremos

prisioneiros – libertos

de

nós mesmos.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Se eu voltasse a ser criança


Walnize Carvalho

Ah!
Se eu voltasse a ser criança
A criança de verdade que fui...

Se este sonho
Se tornasse realidade.
Sentir a infância.
Voltar no tempo...

Viver
Novamente
Um mundo de sonhos
_sonhos dourados
Com bonecas
De pano
De louça...

Viver novamente
Um mundo à parte
Todo meu
Inteiramente meu...

Um mundo
Que não pode ser:
Trocado
Roubado
Muito menos vendido
Porque
As fadas
Os dragões
E Cinderelas
Não têm preço.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Conversinhas


Walnize Carvalho

No teatro da Vida procure ocupar papéis alternados. Ora “palco”, ora “platéia” e outras vezes “bastidores”.
Revezando funções dá para se ver o “espetáculo” de vários ângulos e matizes.
Aprenda com o “eclipse”. Um astro deixa de ser visível no todo ou em parte mas nem por isso – sol e lua – deixam de dar um “show” no céu.
• Fale... Olhe. E principalmente escute. Estamos tão carentes de ouvintes!..
• Ouça o papo de um idoso por mais repetitiva que possa ser a sua história.
• Se permita chorar em público, a se olhar no espelhinho dos carros estacionados nas ruas, a perguntar como a máquina do banco funciona, a cantarolar empurrando carrinho no supermercado sem se preocupar de estar pagando “mico”.
• Saiba distinguir até que ponto você é “bom” ou é apenas “útil” para alguém.
• Cuide para que o seu corpo, não tenha ossos enfraquecidos como seu espírito não sofre de “osteoporose”.
• Aprenda a se fazer companhia. Solidão nem sempre é isolamento.
• Procure ter pares no seu dia-a-dia.
Ter par não é só ter “par romântico”.
Podemos ter parceria em idéias, gostos, prazeres independente de idade e sexo.
• Tenha como meta a palavra “entusiasmo”.
Ele é que nos faz caminhar, em qualquer idade, em qualquer ocasião ou oportunidade.
Ânimo sempre! Quer seja para comprar aquele vestido tão sonhado na vitrina ou aquele batom no camelô da esquina.
• Organize sua agenda pessoal mas não se esqueça de colocar nela compromissos literários e culturais.
• Esqueça as marcas do tempo em sua face. Não queira enrugar a alma.
• Suavize seus atos rotineiros. Não os faça como se cumprisse tarefas.
• E ao acordar descortine o dia como se ouvisse o chamamento:
“Hoje tem espetáculo”! e responda:
- “Tem, sim senhor”.
Verifique qual o papel a você determinado. Abrace-o com garra. E “sucesso”!

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Uma senhora chamada Cidade



Walnize Carvalho

Na varanda sentada em sua cadeira de balanço, a velha senhora observa a planície.
Vê por entre os verdes canaviais alguns filhos seus com foice e enxada em mais uma labuta diária. E, suspirando, balbucia: - Estes são o meu orgulho!
Fechando os olhos visualiza outros tantos que como aqueles madrugam em busca do pão do dia-a-dia.
A prole é imensa: vai de operários a doutores.
Sabe quantos têm por ela respeito e consideração. Mas... enxugando as lágrimas reconhece que há os que se perderam no caminho e a fazem sofrer.
Lembra que em tempos idos ela – esta agora mãe sofrida – era reconhecida pelos seus valores e tradições merecendo o título honroso de “Espelho do Brasil”.
Recorda também com saudade de ter sido chamada de “Intrépida Amazona”, de “Terra do Açúcar” e porque não da goiabada dado o perfume que exalava das entranhas de suas usinas e fábricas.
Mesmo amargurada sabe que ainda há muitos que desejam vê-la soerguida. Almejam que se levante da cadeira e saia do estado de prostração em que se encontra.
Pois, não foram poucos os filhos que a cantaram em prosa e verso.
Não foram poucos os filhos que levaram o seu nome para rincões distantes...
Um breve cochilo a faz sonhar.
Tem a nítida impressão de ouvir o apito da Fábrica de Tecidos; o movimento de entra e sai de “suas crianças”.
Parece ver o alarido de seus meninos descendo as pontes pedalando suas bicicletas - verdadeira revoada de pássaros.
Desperta.
Volta o olhar sobre o horizonte.
Nova onda de nostalgia a invade e se pergunta: - O que fez com que alguns de seus filhos se tornassem irreconhecíveis, verdadeiros vilões? E se responde com certa culpa (as mães sempre se acham com culpa): - Seria a fortuna adquirida e a ânsia de querer mais?...
Levanta-se da cadeira de balanço.
Caminha para o quarto. Deposita sobre a cômoda o terço que trazia em suas mão
E como “coração de mãe não se engana” tem esperança de que os filhos desgovernados retomem o caminho da retidão e devolvam-lhe a dignidade e honradez.

sábado, 24 de setembro de 2011

Liberdade maior



Walnize Carvalho

Queria ser livre
Correr mundos
Viver!...
Até que um dia
(que dia!)
Uma ventania de fim de tarde
Satisfez
O seu desejo.
Que felicidade!
Nos braços do vento
Foi em busca
Da vida sonhada
Da viva
Somente vivida
Pelos passarinhos
Que vinham pousar na árvore em que morava.

E
Lá se foi ela.
Feliz
Correu quintais
Atravessou muros
Percorreu quintais...

Até que...
Um vento maroto
A fez cair
No rio que cortava a cidade.
Levada pelas águas
Se foi para
um mundo
liberto
um mundo
distante
pra não mais voltar..

-Esta é a história de uma folhinha que um dia se foi da árvore do meu quintal.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Alívio




Walnize Carvalho

Chegara apressada a casa.
Mal tivera tempo de abrir a porta e...calçados pro ar!
Correra em busca de algo que para ela seria de extrema necessidade.
Viera, há poucos minutos atrás, pela rua distraída e ansiosa . Nem vira a vizinha com seu “boa tarde”costumeiro.Trazia nas mãos, flores colhidas na calçada.
Chegara realmente apressada.
Estaria em busca de um copo d’agua para matar a sede, já que o sol forte da tarde de primavera com ares de verão ainda brilhava no céu?
Estaria à caça de um analgésico para uma eventual dor de cabeça, pois o dia de trabalho fora exaustivo?
Estaria necessitada de farta refeição,pois estivera tão atarefada que não tivera nem tempo de lanchar?
Não. Como uma criança travessa que sobe na cadeira em busca de guloseimas dentro do armário ela dirigiu-se à cozinha preparou um chá, ajeitou na bandeja, com biscoitinhos e uma jarra miúda onde colocou as flores.
Abriu o computador.Com a setinha (que para ela era mágica) clicou no site preferido.
Lá encontrou a poesia ,que bem sabia, iria aliviar a sua alma.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Freddie for a Day

Depois de muitos e muitos meses resolvi postar algo por aqui.
Freddie Mercury completaria no último dia 5 de setembro 65 anos. Entre as várias iniciativas para marcar a data está a disponibilização do antológico show em Wembley.
Freddie for a day

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Risos


Walnize carvalho

O sol amanheceu rindo pra ela. Lembrou-se de que, em criança, sempre ria...sorria ... dava gargalhadas.
Quando, com a prima, que vinha à cidade para as festividades do padroeiro se reunia riam,riam.
Contava piadas, ria. Contava histórias, ria. Adolescente, não mudou nada. Ria com as colegas, dos professores, de tudo que eles falavam. Ria ao telefone. Ria de si mesma Ria dos outros e para os outros .
Adulta, ela continuava rindo. Na escola, já então professora, fazia quadrinhas humorísticas, ao fim de cada ano letivo ofertava- as aos colegas e funcionários.
Ria,riam todos .
O tempo foi passando com riso ou pouco riso, os anos escoavam.
Um dia, uma amiga comentou: “Quem ri demais provoca ruga em volta dos olhos”. .Olhou-se no espelho. Lá estavam elas,as rugas .Achou injusto que as pessoas alegres envelhecessem rapidamente .
Continuou rindo e filosofando: “Minhas rugas em volta dos meus olhos são alegria”.Mas, de vez em quando , se flagrava no espelho, olhando aqueles sulcos na face .Começou a rir frente ao espelho.Frente a frente, num duelo com o inimigo. Até que teve uma certeza. Uma certeza da qual não achava graça. Aquele semblante enrugado não era marca comum da idade. Era sua tristeza - sua imensa tristeza - escondida de todos e de si mesma com tanto afinco e cuidado durante toda a vida, que agora começava a aflorar.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

A inquieta


Walnize carvalho


Ela não me dá sossego.

Por sua causa
Atravesso ruas sem ver sinal luminoso
Entro no banho de relógio no pulso
Dou boa noite em pleno meio dia.

Por sua causa
O café esfria na xícara
Perco o sono
Ganho peso.

Por sua causa
Rabiscos palavras desconexas
esquecida dos óculos
sobre a mesa.

Por sua causa
Rego plantas conversando
Ouço pássaros
fazendo dueto com eles.

Por sua causa
Falo
Rio
Choro sozinha.

É uma criança inquieta,
que só dá trégua
Quando a coloco
no lugar que mais almeja - o papel
Ela: a Poesia.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Alívio



Walnize Carvalho

Chegara apressada a casa.
Mal tivera tempo de abrir a porta e...calçados pro ar!
Correra em busca de algo que para ela seria de extrema necessidade.
Viera, há poucos minutos atrás, pela rua distraída e ansiosa . Nem vira a vizinha com seu “boa tarde”costumeiro.Trazia nas mãos, flores colhidas na calçada.
Chegara realmente apressada.
Estaria em busca de um copo d’agua para matar a sede, já que o sol forte da tarde de primavera com ares de verão ainda brilhava no céu?
Estaria à caça de um analgésico para uma eventual dor de cabeça, pois o dia de trabalho fora exaustivo?
Estaria necessitada de farta refeição,pois estivera tão atarefada que não tivera nem tempo de lanchar?
Não. Como uma criança travessa que sobe na cadeira em busca de guloseimas dentro do armário ela dirigiu-se à cozinha preparou um chá, ajeitou na bandeja, com biscoitinhos e uma jarra miúda onde colocou as flores.
Abriu o computador.Com a setinha (que para ela era mágica) clicou no site preferido.
Lá encontrou a poesia ,que bem sabia, iria aliviar a sua alma.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Anéis e alianças


Walnize Carvalho

Passo pela sala. A tevê está sintonizada em um telejornal. No canal, as notícias são levadas ao telespectador através da fala do locutor e de legendas ao pé da tela.
Detenho o passo apressado e leio com curiosidade: “Sonda descobre mais dois anéis de Saturno”.
A cabeça gira no tempo e logo a figura do professor de Ciências dos idos do ginásio (não me recordo o seu nome) aparece aos meus olhos. Ele e a explicação detalhada: “Os anéis de Saturno são constituídos de mistura de gelo, poeira e material rochoso”. E seguia: “Os maiores anéis possuem nomes próprios”...
Reorganizo as idéias e saio à rua. Meu destino é a empresa de telefonia local.
Chego ao majestoso prédio azul, que fica na confluência das ruas Treze de Maio com Formosa, cheia de papéis e perguntas.
Reflito. Haverá alguém para dar-me a informação de que preciso? Afinal, são tempos “on line” e, por certo, não encontrarei cabines, sorridentes telefonistas, listas telefônicas e nem filas de espera.
Abro a porta de vidro fumê. Entro no ambiente de ar refrigerado e computadores. O segurança (homem alto, forte, meio sorriso e terno escuro) após minha indagação aponta-me a sala em frente.
Dirijo-me à atendente. O ar frio do recinto não a contamina, pois o atendimento, além de pessoal, é complementado de calor humano e de dados precisos.
Débora (é este o nome que está no crachá) – a solícita funcionária – explica-me a possibilidade de união em “um só pacote das telefonias fixa, celular e o uso da Internet”.
Casamento perfeito, pensei.
Ao entregar-me o protocolo de atendimento meu olhar fixa em suas mãos. O dedo anelar esquerdo ostenta uma aliança larga e dourada. Em suas unhas esmaltadas destacam-se minúsculos brilhos como fossem estrelinhas.
E, novamente, a fala mansa do mestre ecoa em meus ouvidos: “Como no velho ditado, onde há fumaça há fogo, em Saturno se há um anel possivelmente há uma lua”.
Deixo o prédio.
Retorno à rua meio atônita, “no mundo da lua”, pois inúmeros afazeres me aguardam no decorrer do dia.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Em tempo de festa do Padroeiro...


Coração em festa

Walnize Carvalho

O mês de agosto que chega.
O resgate de um agosto qualquer da remota juventude atravessou o dia. Dia de sexta.
Na memória, a ansiedade com que eu aguardava a chegada dos primos, que vinham do interior para a festa do padroeiro da cidade. Vinham na véspera do grande dia.
Como que fazendo contraponto com as batidas do meu coração, o relógio de parede da casa da vizinha batia tão alto e sempre às horas certas.
Um grito amigo ecoava na porta da casa: - Bota água do feijão! Era o código que a família (tios e primos) acabara de chegar.
Na bagagem, além de roupas e calçados novos, traziam doces caseiros (ainda quentinhos) em compoteira amarrada por toalha de saco alvinha e bordada com o dia da semana: SÁBADO. Cuidadosamente, o recipiente era guardado na cristaleira de casa para “depois do almoço” – sentenciavam os adultos.
E grande era a pressa de almoçar, saborear a sobremesa e, principalmente, passar o restante da tarde conversando, rindo e nos preparativos para o dia seguinte.
Seis de agosto. Seis da matina.
Éramos acordados com o sino de igreja distante. Saltávamos da cama e disputávamos o lugar na fila do banheiro para, após o café matinal participarmos de quase todos os eventos da Festa do Santíssimo Salvador.
E tudo começava pela manhã.
Primeira parada: Corrida de bicicletas onde assistíamos em frente ao“Balalaica” na Alberto Torres, aos velozes atletas. Em seguida, nosso destino era a Beira Rio para apreciarmos as Regatas. O remo ( um dos mais tradicionais esportes de nossa cidade) era um espetáculo à parte.
Retornávamos à casa para o almoço,um breve descanso e esperar que os adultos avisassem que poderíamos nos arrumar para o “segundo tempo” da Alegria.
Era tardinha. E lá íamos nós, rumo às festividades.
Nós, meninas, de saias plissadas, casacos com golas de lã, sapatos de saltinho “Luiz XV” e batom “Labatte” nos lábios. Nos olhos, um brilho de felicidade.
Como na parte da manhã, íamos a pé e de mãos dadas. O eco de nossas gargalhadas felizes corria pelas ruas como o vento sul que sempre se fazia presente nesta ocasião do ano.
Caminhávamos da Rua do Gaz até a Rua Sete. E nesta, a parada dos adultos para olharem as vitrines enfeitadas era obrigatória: calçados na Almeida, louças no Dragão, tecidos na Imparcial, o que aumentava a impaciência da meninada ávida em alcançar a praça.
Como a chegar em um oásis, avistávamos as torres da Catedral. Com sacos de pipocas à mão (os meninos com cataventos de papel e bandeirinha nacional) postávamos em frente ao templo para observar o encontro de amigos, ouvir as bandas de música, aguardar a procissão, extasiar com a apresentação da Esquadrilha da Fumaça sobre o Rio Paraíba e admirar a tão esperada queima de fogos.
Era a festa. Festa do Santíssimo Salvador. Festa do padroeiro da cidade.
E são estas fatias de ingênua felicidade que vieram dar sabor às minhas lembranças neste agosto de 2011.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

A menina e os passarinhos


Walnize Carvalho


(para a neta Clara.Escrito quando ela era menininha,hoje já está com 15 anos!)

A menina saiu do ninho( o colo da avó) e correu para a varanda da casa- casa da infância do pai.
Olhou com olhos curiosos para a rua e avistou na outra calçada, no fio elétrico dos postes , pássaros enfileirados.Curiosa, perguntou: - Vó! Onde moram os passarinhos?O que eles comem?
Dadas as devidas explicações e... brincadeira inventada.
A avó correu à mesa desfeita do café da manhã e recolheu farelos de pão.Juntas, colocaram no parapeito da janela.
Depois,escondidas,passaram a vigiar os passarinhos se alimentando...
A lembrança da neta,que viera lhe visitar(mora em Macaé) ficou registrada.E, toda manhã,como a obedecer a um ritual,a avó coloca o alimento.
Pela janela da sala vê os passarinhos virem se alimentar felizes.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

A flor e a mulher



Walnize Carvalho

Passeia pelo jardim da praça.
Como um garimpeiro
Olha
Cantos
Recantos
Frestas de árvores
Teias de aranha
Ninhos e flores.

Vê uma rosa no chão:
Rosa-mulher.
Alguém a arrancou da roseira
A aspirou
E a jogou no chão.

Suas pétalas estão ressecadas
Pele de mulher clara.

Senta-se no banco da praça
Despetala carinhosamente a flor
Retocando os seus traços.

A cada pétala tirada
Descobre dentro da rosa
Uma luz
Uma beleza interior.
Um botãozinho bem vivo
Bem brilhante
Olhos azuis em um rosto enrugado.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Devaneio



Walnize Carvalho

Imaginem se pudéssemos chegar ao balcão de uma loja pedindo: - Embrulhe em papel de presente (o mais vistoso) uma caixa recheada de Paz. Ou se ligássemos para um hortifruti solicitando: - Separe duas dúzias (bem fresquinhas) de Harmonia e traga no endereço tal. Ou se fizéssemos (via Internet) uma encomenda urgente de três pacotes de Felicidade?!? No mínimo, significaria devaneio ou surto de loucura! Mas se somos todos “loucos” por esta trilogia ( paz, harmonia e felicidade ) seria uma conquista e tanto. Seria?
Convenhamos, que se nos fartássemos de tais iguarias em tamanha proporção estaríamos fadados à indigestão, tamanho peso no estômago e que antiácido algum daria jeito.
A escolha sensata é a de sempre saborearmos desses doces sentimentos enumerados, em porções balanceadas e, se possível, mescladas com amargos sabores (Dor, Tristeza e Saudade) o que torna a refeição – digamos assim – agridoce.
Se pensarmos bem, concluiremos que a vida nos oferece um banquete de cardápio variado. Só nos resta optar pelo “prato” a ser digerido.
À cada dia, desde o café da manhã pesamos na balança do bom senso nossas decisões. Devemos observar com cautela, qual o caminho a seguir: ou renunciamos a um projeto tão sonhado ou persistimos nele até que se concretize.
Muitas vezes, por açodamento, procuramos o caminho mais curto, mas que nem sempre nos leva a lugar algum.
De outra feita, somos tomados por forte indecisão. É como que chegássemos a um self service; parássemos diante de variada gastronomia e nos indagamos: feijoada ou massa?...
No “bate e rebate” do cotidiano estamos para perder ou ganhar; lutar ou resignar; nos reprimir ou nos libertar.Não é esta a receita de um bem viver?
Há dias em que o choro nos lava a alma. Em contrapartida, há momentos em que o nosso riso em excesso revela uma falsa euforia.
Repetimos à exaustão: “Todos temos o direito de ir e vir”. Mas sabemos sempre quando ir ou quando vir?...
Será que avaliamos com precisão quando é a Razão ou o Coração que deve falar mais alto? ...
São estas indagações que dão tempero a nossa vida. Concordam?
Retomo ao devaneio do início da crônica: ter por inteiro a Paz, a Harmonia e a Felicidade.Pura ilusão! Elas nos são servidas em fatias!...
O interessante é nestes momentos cada um de nós: apaziguar o coração, harmonizar o espírito e se felicitar com os consagrados versos : “Felicidade...Esta árvore milagrosa que supomos/ arriada de dourados pomos/ existe sim,/ mas nós não a alcançamos/ porque está sempre onde a pomos/ e nunca pomos onde nós estamos”.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

A menina no cinema


Walnize Carvalho

Foi só ela entrar no cinema para que se transformasse.
As cadeiras acolchoadas e aconchegantes (verdadeiro colo) e mais a trilha sonora a transportaram. Abrindo o saco de pipocas – pensou – sem disfarçar o sorriso: - Estou deixando lá fora a pessoa adulta que sou e me encontrando com a “minha” menina.
. Bem posicionada deixou que os olhos se fixassem na tela. Nem pestanejava. Colocava pipocas na boca com avidez e displicência deixando algumas caírem sobre seu colo.
Aos poucos, embalada pela magia da história, foi se distanciando de si mesma.
Era tempo de férias.Férias de julho. Havia crianças e jovens barulhentos à sua volta. Ela não os escutava. Também estava de férias: férias “daquela” que deixou lá fora.
Alguém pediu (pela terceira vez, talvez) licença para passar e sentar-se na mesma fileira.
- Hã!?..., pois não, pode passar! – respondeu de forma automática.
E por minutos se dispersou da cena e pensou “naquela” que ficou do outro lado da sala de projeção.
Suspirou. – Coitada, tão cheia de compromissos, tão cheia de contas a pagar, tão cheia de problemas para solucionar, tão submersa em ocupações e horários, tão... tão.... robotizada!
Em certas ocasiões tão cruel se olhando no espelho e questionando: - Já viu suas rugas na testa? – Reparou nos seus cabelos embranquiçados? – Poxa! Você engordou, heim!? E a mais terrível das provocações: - Não vê que você não é mais uma menina!...
Mexeu-se na poltrona e balbuciou: - Não! Aqui neste momento “ela” não irá me abater.
Tentou ver o filme. Mas de novo cenas legendadas passaram diante do seus olhos: “a outra” até tem certa razão, afinal, ser responsável, cumpridora de suas obrigações não é papel fácil de se representar.
Novamente o pensamento contraditório: mas tanta disciplina todo tempo? Todo dia? Toda vida? Definitivamente, não! – deixou escapar em voz semi-alta.
Afinal, ela precisa fugir um pouco dos compromissos; dar asas à imaginação; ser feliz sem hora marcada e, acima de tudo, eliminar a culpa. Assim, de repente, no meio da tarde estar no cinema desfrutando o direito de ser criança.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Eu não sei pra que que a gente cresce


Walnize Carvalho

Amanheci com estes versos de Ataulfo Alves batucando na cabeça.
E fiquei horas cantarolando porque gosto de “Meus tempos de criança” e também para contrapor ao som do bate-estaca que vinha de uma obra em frente à rua onde moro.
E de tanto repetir me dei conta de que o lamento de crescer é de perder a ingenuidade. E dia após dia, ela – a ingenuidade – nos é tirada.
Num giro de memória chego ao mês de julho de infâncias distantes. Era sinônimo de férias, descompromisso e encerramento de um ciclo. Hoje o tempo é um menino travesso que corre atrás de nós a nos alcançar os calcanhares sem, ao menos, nos dar a chance de pedir “mandrake”.
Quem diria que transformariam os heróis em quadrinhos Mônica e Cebolinha em adolescentes e matariam o Batman?
Somos a todo momento lembrados de nossas obrigações. As siglas IPTU, IPVA, IR, PIB, NET estouram aos nossos olhos brilhando mais do que os POW... POW dos fogos de artifício de festas juninas
Sinceramente, como esquecer a antiga delicadeza dos encontros fraternos, da troca espontânea de presentes tão contrastantes à atual comercialização de afetos, dissimulação de simpatias e a ânsia das pessoas que se obrigam a ser felizes a qualquer preço?...
Neste ping-pong entre passado e presente, por certo, vários paralelos seriam lembrados que, fatalmente, não caberiam neste espaço.
Prefiro estancar as lembranças ao mesmo tempo em que sou absorvida pelo silêncio da rua.
Olho pela janela e vejo que as máquinas silenciaram. Os operários interromperam a obra e fazem sua sesta.
Volto a mim mesma e encerro esta crônica – nostálgica, irônica e saudosista – com outro trecho da canção que diz: “Eu era feliz e não sabia..."

sexta-feira, 24 de junho de 2011

De mãos dadas com a alegria


Walnize Carvalho

Estamos em plena temporada das festividades juninas.E tudo gira em torno destes santos milagrosos:Santo Antônio (13/06),São João (24/06)- hoje- e São José ( 29/06). Eu falei juninas? Pois de há muito mudaram (com raras exceções daqueles que ainda conservam-nas no referido mês e respectivas datas) para julho( julhinas) e até agosto (agostinas) !...
Mesmo assim,percebe-se que o povo é festeiro e mais do que isso, devoto. Os arraiás estão montados; as barraquinhas devidamente decoradas e com toda sorte de variados quitutes: broas de milho, cocadas, pamonhas ,quentões...
Apesar de tempos apressados e modernos sempre tem os que cultuam a tradição desta festividade, tão arraigada em nossa cultura.Isto é sempre um bom sinal.
Observo, no entanto, que há certas formas de comemorações que fogem dos padrões destes festejos.
Sempre aparece alguém que exagera em jeitos e trejeitos que não condizem com os modos do genuíno caipira, parecendo uma caricatura. E – convenhamos- tal atitude acaba por ridicularizar a si mesmo.
Não raro, há também nos trajes uma acentuada disparidade. Enquanto alguns se vestem de forma rota e desgastada, simbolizando pobreza, outros também confundem a indumentária. O que se vê são homens de botas de couro e coletes de franja imitando caubóis norte-americanos e mulheres de roupas de seda e cetim parecendo sinhazinhas extraídas dos romances de José de Alencar. Uma expressão, sem propósito, de suntuosidade.
É lamentável que pouco restou da autenticidade (principalmente nos grandes centros).Até as simples faixas amarradas em postes das cidades viraram chamadas para o “evento” em propagandas do tipo: “A gente comemora a temporada de São João com alegria do folião no Carnaval.” ou “O melhor do hip hop no nosso Arraiá.”.E nestes acontecimentos a presença de modelos, artistas globais, ex big brothers e outros notórios posam de “donos da festa”.
Ainda bem que nos bairros periféricos, distritos e cidades de porte médio os santos homenageados – Santo Antônio, São João e São Pedro – são lembrados com as tradicionais festas de roça, onde imperam comidas feitas no fogão a lenha, sanfonas entoando canções típicas e salões decorados com bandeirinhas. Sem deixar de fora a dança da quadrilha (de origem francesa com a contribuição caipira), onde os marcadores comandando os passos da dança fazem com que damas e cavalheiros girem no salão ao anúncio do “Anavan,Anarriê”
Ao final, o que se observa é que todos – modernos ou conservadores – na “Grande Roda” desejam (ainda que por algumas horas) viver a ingenuidade tão distante de nossos dias.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Classificados


Walnize Carvalho

Vende-se um andar cansado.
Compra-se um ombro amigo.
Troca-se uma lágrima por um sorriso.
Aceita-se um papo sem consignação.
Aluga-se um ouvinte para alguma poesia.
Passa-se o ponto de interrogação de “existe a paz?”
Procura-se alguém com tempo
Para desperdiçar o tempo.
Perdeu-se a alegria nas esquinas da vida:
Gratifica-se com um abraço
a quem a encontrar.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Duelo íntimo


Walnize Carvalho

Atravessou as esquinas da VIDA.
Decidida entrou no SALOOM.
Olhares se cruzaram em sua direção.
Porte assustador.
Uma flor vermelha no cabelo.
Um brilho novo no olhar.
Indumentária simples, mas sensual.
Avassaladora. Visceral. Ares de bandida.
Jeito de xerife. Dona da situação.
Causou impacto, temor e silêncio.
Aproximou-se do pianista da casa.
Quis ouvir a “Nona Sinfonia” de Beethoven.
Dirigiu-se ao balcão.
Tomou uma dose de coragem.
Mirou em todas as direções
e surpreendentemente
distribuiu versos românticos.
Atirou pétalas de rosas.
Matou o tédio, a solidão e a inocência
e acentuadamente
FEMININA
saiu do recinto levando como refém, o AMOR.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Amor Maduro


Amor
maduro
é
fruto
escolhido
e
colhido do pé.

Amor maduro
é
sonho
vivido
e
imbuído de Fé.

Amor maduro
é
afeto
estocado
e
derramado
de uma só vez.

É recontar tudo outra vez.

























Amor maduro
é
paixão
revelada
e
dosada de sensatez.

Amor maduro
não é
posse
nem competição
é
serenidade
que oxigena o coração.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

De lírios e sonhos

Walnize Carvalho


Sobre a mesa , a toalha branca acetinada. Bem ao centro, lírios brancos em jarra transparente.
Meu olhar perpassa o cristal e fixa na noiva que esbanja alegria posando para fotografias.
À sua volta – noivo, pais dos noivos e padrinhos – são o retrato fiel da felicidade.
Fico por ali em minha contemplação e vagos pensamentos.
Me vem ,primeiro, à mente as palavras de Jesus,no Evangelho segundo São Mateus: “Olhai os lírios do campo ; eles não trabalham nem tecem; no entanto eu vos digo: mesmo Salomão,em toda sua glória, não se vestiu como um deles”.
No segundo momento, reflito sobre a simbologia do branco: Paz, serenidade, clareza ,quietude, expressão de luz e do Bem.
Fazem eco em meus ouvidos as palavras proferidas ao pé do altar: “ hei de amar-te todos os dias de minha vida”.
Menos introspectiva , debruço sobre a plenitude do momento.
Constato que cerimônia de casamento é assim: momento de contrição, de emoção e também de descontração.
Todos os presentes acompanham e participam desde - os atores principais - (os noivos) como - os coadjuvantes- (os convidados) da magia reinante.
É como se estivéssemos protagonizando um verdadeiro conto de fadas.
O casal embarcado na carruagem da paixão, adornada de sonhos e desejos, passa pelo cortejo que reverencia e aplaude efusivamente.
Seguem-se os abraços, os votos de perene felicidade, os brindes regados a champanhe, os comes e bebes...
E quem ousa quebrar o encantamento e projetar o futuro , meditar sobre a prole, visualizar dificuldades , imaginar as etapas a serem vividas e vencidas?
Pouco importa ,neste momento, conjeturar qual das expressões irá vingar: “Felizes para sempre”, “Eterno enquanto dure” ou “Até que a morte os separe” ...O momento é do coração sobrepor a razão.Planejar o que virá é puro delírio!
O Amor - o dono da festa - carrega os noivos para o meio do salão.
Eles dançam, riem, rodopiam esquecidos dos que testemunham a bem aventurança.
Como esquecido também sobre um móvel,o buquê da noiva.De lírios brancos.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

No corre corre do dia a dia...


Sobras e faltas
Walnize Carvalho

Sobra vontade
Falta entusiasmo.

Sobra ideia
Falta palavra.

Sobra projeto
Falta realização.

Sobra riso
Falta alegria.

Sobra castelo
Falta areia.

E assim...
Vai-se largando pelo caminho
O que não se conseguiu juntar...

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Esquisitice


Walnize Carvalho

Do Carmo passa por meu portão por volta das 11 horas de certa manhã. O sol abrasador se faz presente, mas a senhorinha está toda arrumada para o seu passeio, sem nem se dar conta do imenso calor. Pára e relata com a tradicional simplicidade o trajeto daquela manhã.
Convido-a para entrar. – Não, outro dia! – responde-me. E revela o seu prazer matinal: Irá ver “as modas”; rodar pelos shoppings e Bancos, onde (mesmo sem nada comprar e nenhuma transação bancária efetuar) desfrutará do ar refrigerado que estes ambientes possuem. Sentará em um dos bancos da agência dos Correios e ah! ... irá aos supermercados comparar preços.
Na sua esperteza-inocência não percebe o sorriso maroto que surge no canto dos meus lábios.
Conta sem pudor: - Adoro ter 60 anos!... Tenho passe-livre que me leva de ônibus a conhecer lugares e pessoas. E arremata transpirando felicidade: - Amanhã vou sair bem cedo de casa. Pretendo ir a São João da Barra. Pela janela da condução irei olhando a natureza e recebendo a brisa no rosto. Chegando lá, visitarei a terra natal de minha avó. À tardinha estarei de volta.
E completa, radiante:
- Soube que as copas das árvores da praça principal estão podadas. Ficaram uma beleza só!
Esquisitice ou felicidade? Qual o melhor título?!

sexta-feira, 6 de maio de 2011

A menina do cacho dourado



Walnize Carvalho

A menina é loura. Tem um anel de cabelo no alto da cabeça: um cacho dourado.
Mora em uma casa grande, de janelas altas. Próxima à rua. Rua movimentada.
Suas tardes ( já que nas manhãs vai à escola) são passadas na janela, olhando os que passam na calçada.
Seu pai é alfaiate.
O ateliê fica no primeiro cômodo da casa, bem na face da rua.
Encostada à janela, encontra-se uma mesa alta. De alfaiataria. É nela, que a menina sobe para espiar a rua. E só o faz, quando o pai não está cortando tecidos, para a confecção de ternos de seus fregueses.
Sobre a mesa e pela janela alta ela vê o mundo: uma enorme vitrine. Nela perfilam pessoas, carros, animais...
E sonha...Sonha correr livre pela calçada, atravessar ruas, ir à esquina comprar balas.Mas, qual? Só acompanhada dos pais ou da professora, que mora na mesma rua e costuma levá-la a escola.
A menina na janela faz projetos: usar óculos, um deles. Pensou até em pedir à mãe para ajudá-la nas tarefas domésticas descascando cebolas. Quem sabe, com olhos vermelhos e lacrimejados conseguiria tal feito? Recebeu um “Não”.
No outro dia, passou pela calçada uma moça de braço fraturado e engessado. Fechou os
olhos e sonhou...Sonhou ter subido na goiabeira da casa da avó, que mora no interior.Desequilibrou e...tbum! ganhou o chão e o “braço postiço”.Acordou e parece ter ouvido da mãe:”meninas comportadas não sobem em árvores!”...
A menina segue em seu devaneio. Ela e a janela.
Agora observa as folhas, que caem das árvores. Embarca no vôo com elas e percorre calçadas, cidades, mundos!...
As pessoas passam. Acham graça do seu sorriso,seus trejeitos,seu canto.E exclamam:
-Olha, que garota bonitinha! Que bons modos! Ela tem um cacho dourado na cabeça!
A menina sorri. Desce da janela.
O caderno de matemática a espera no seu quarto.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Princesa de apartamento


Walnize Carvalho

“Era uma vez, em terras distantes, um pequeno reino cheio de paz, prosperidade e rico em lendas e tradições...” E segue a história extraída de um grosso livro de capa marrom e letras douradas.
A menininha que a tudo ouve e a tudo vê dá um salto do sofá e vai em busca do traje que a avó irá vesti-la.
Desta feita, enquanto assiste no DVD “Cinderela” – um dos mais belos contos de fada – a vestimenta lhe é cuidadosamente colocada: vestido azul de saias rodadas, luvas de cetim e (como não pode faltar) a coroa dourada na cabeça.
Entre rodopios e atenções às cenas de tevê, a bela princesa ri, gesticula e cantarola.
Seus olhinhos brilham enquanto aos poucos os de casa vão assumindo os papéis que ela determina: o rei, a rainha, a fada madrinha, o príncipe...
A um canto o cavalinho de pau parece que ensaia um galope enquanto a cadeira da sala de jantar está prestes a se transformar em uma suntuosa carruagem.
De repente, o apartamento do sexto andar se torna o mais luxuoso castelo, onde imaginários lustres e escadarias cobertas de tapetes vermelhos compõem o ambiente de pura magia.
Nem mesmo o som de uma freada brusca de carro na rua consegue suplantar a música encantada que ecoa no “palácio”: “Cinderela, Cinderela o seu nome é uma canção/ Cinderela deixa o coração voar/ E assim poderá realizar/ O seu sonho encantador...”
A princesa do apartamento (que hoje completa três anos) reina em seu mundo à parte.
Por alguns minutos senta-se e emudece.
Fixa o olhar nas cenas que se sucedem: meia-noite. A princesa desce correndo as escadarias. A perda do sapatinho de cristal. A abóbora. As vestes rotas. O encanto desfeito.
A campainha toca.
A menininha cheia de entusiasmo grita: - É o príncipe! E abraçando o pai (que traz nas mãos uma caixinha de presente) lança a pergunta: - Você trouxe o sapatinho de cristal?
Risos. Afagos.
Na tela da tevê a cena final: a carruagem segue levando o príncipe e princesa...
... “E foram felizes para sempre”.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Novamente



Walnize Carvalho

O Valor das Palavras
O enorme valor do prefixo RE.
Em tempo de RESSURREIÇÃO, vale REFLETIR. Que tal?

REcitar um poema?
REdescobrir um caminho?
REatar uma amizade?
REver um amigo?

REalçar um sorriso?
REacender uma paixão?
REcontar uma história?
REconquistar um afeto?

REpensar a solidão?
REler um bom livro?
REciclar uma idéia?
RElembrar a infância?

REfazer um trajeto?
REtribuir um gesto?
REaprender com o idoso?
REviver uma emoção?

REencontrar a si mesmo...

“REinventar a VIDA?”

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Busca


Walnize


Eu busco um sorriso

Sorriso puro

Que não seja um riso só.

Eu busco um canto

Um canto igual Canto de paz.

Eu busco no Tempo

meu tempo Sem tempo de voltar.

Eu busco um olhar

Olhar criança

Olhar esperança.

Eu busco o AMOR

O Igual

A Paz

E muito mais!

Eu busco um céu

Onde brilhem estrelas

De todas as cores De todas as luzes

De todas as raças

E que reunidas

Só tenha o tom:

IGUALDADE.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Desarmamento


Walnize Carvalho

No bangue-bangue da Vida/ é preciso .../ desarmar corações empedernidos/ combater conceitos preconcebidos/ distribuir balas de puro mel/ limpar da boca amargo fel/ desconsiderar algo sem relevância/ desatar nós de ignorância/ cultuar a fraternidade/ defender a liberdade/ desfraldar sorrisos ao vento/ viver o fugaz momento/ decorar um poema bonito/ desprender de enfadonho rito/ desmistificar que é “dono da verdade”/ soltar “a criança” em qualquer idade/ reverenciar o sonhador/ acreditar no Amor/ desenraizar a amargura/ exercitar a ternura/ conservar a calma/ desenferrujar a alma ...
E
armar-se de boa dose de ânimo/ para enfrentar a batalha do cotidiano.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

"Primeiro de abril- seu pai caiu, sua mãe não viu!"


Walnize Carvalho

Já vai de longa data (e bota tempo nisso) que o Primeiro de Abril é considerado o dia da Mentira.
Sempre fui sabedora de que se trata de um dia em que se prega uma peça em alguém a título de gracejo.
Em minha memória cinqüentona há registros e registros de brincadeiras que eu fazia e que faziam comigo nesta data,( "hoje não tem aula"; "Seu zé da venda está distribuindo balas":"mamãe tá te chamando!"... ) sempre arrematadas pela seqüência de palavras: “Primeiro de Abril – seu pai caiu, sua mãe não viu”.
Os tempos mudaram e a data transformou em um acabar sem fim de relatos inofensivos, outros maldosos, que vão desde convites para casamento de pessoas que nem se conhecem, convocações para falsas reuniões, como as pregadas na imprensa nacional e mundial a título de confundir a opinião pública.
Prefiro deter-me em “pegadinhas” com sabor de descontração, mas sabendo que manifestações folclóricas serão sempre eternizadas no mundo inteiro.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Gata Borralheira às avessas


Walnize Carvalho
Abriu os olhos para o dia e diante deles passou um letreiro luminoso: A VIDA É UM TEATRO.
Enquanto caminhava para a mesa do café da manhã, a mulher se dava a filosofar ... A vida é um teatro ... Mais do que sinônimo de representação cênica, mundo ilusório, vida fictícia, o que não é o teatro senão a própria vida encenada no palco?
Nele temos vários papéis a desempenhar no dia-a-dia. E, se possível, com prazer e autenticidade – meditava.
Naquela manhã de outono, com ares de verão, sentiu que começara bem o seu dia.
A mulher se deu a tarefa de remexer guardados, faxinar cantos, cuidar de forma mais ordenada dos afazeres domésticos.
Seguia, distraída, com música suave a lhe fazer companhia, desempenhando o referido papel. Papel este que não exigia da “atriz” nenhum ensaio e nem texto bem estudado. Bastava apenas disponibilidade, energia e disciplina.
E com a atividade quase por cumprir lembrou-se que estava atrasada para um compromisso.
Trocou apressadamente de roupa e saiu à rua.
Corria pelo caminho, levada pela brisa da manhã deslizando lépida e feliz por entre carros, pessoas, árvores e calçadas.
Como em um conto de fadas, em sua mente havia um relógio imaginário que a qualquer momento iria “badalar as doze horas, fazê-la perder o sapatinho de cristal nas escadarias e transformá-la em outro figurante” ...
Assim, a mulher, cheia de encantamento e alegria chegou a tempo de participar de mais um encontro literário e desempenhar no “teatro da vida”, mais um personagem: o de POETA.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Jogos da vida



Walnize Carvalho

“Jogando e aprendendo a jogar/nem sempre ganhando/nem sempre perdendo/mas aprendendo a jogar!...”

Nos jogos da vida
baralhar
escolher
arriscar
recuar
ir em frente
dar um passo atrás
lutar
resignar
aceitar
chorar
rir
renunciar
aprisionar
libertar.
Jogar com determinação.
Manejar
com destreza as adversidades.
Sentir firmeza nas decisões tomadas.
Evitar a qualquer preço
fazer ping pong dos sentimentos alheios.
Não promover “quebra de braço” entre egos inflados.
Na hora do xeque-mate
esquecer vencedor e vencido.
Nas batalhas do dia a dia
munir-se de muito jogo de cintura.
Na vitória
ou nas derrota
se certificar de ter jogado limpo.
Estar consciente
que o exercício de viver o livre arbítrio é peça chave que nos move.
E assim...
conseguimos
expressar
aprender
ensinar
e descobrir que
a coragem
é a carta que trazemos na manga do paletó.

sexta-feira, 11 de março de 2011

Ressaca


Walnize Carvalho

Hic! Um soluço interminável, um peso enorme na cabeça (como se pousasse sobre ela um elefante), um gosto amargo na boca – gosto de cabo de guarda-chuva, dizem alguns -, náusea, mal estar, “estômago embrulhado” e o olhar distante fixado em lugar algum.
Sabem de quem estou falando? Da famosa ressaca que, principalmente, nos últimos dias (dias que sucedem ao carnaval) a muitos abate.
Estranhamente reconheço que tenho quase todos os sintomas citados, embora não ingira bebida alcoólica nem tão pouco tenha participado da festa.
Sou tomada de uma leve prostração, de desalento, de incômodo, e com o olhar distante fixado em lugar algum constato que também estou de ressaca, mas de uma ressaca atípica. Sinto no ar o esgotamento de valores duradouros e autênticos, uma falsa euforia, uma vontade de que a fantasia não desbote e a que máscara fixe no rosto e não descole tão cedo.
Há o cansaço do “ser eu mesmo” e o desejo de que o personagem construído assuma o papel principal.
Neste estado letárgico não há receitas caseiras do tipo: muita água de coco, sal de frutas, banho de mar e até os conselhos de “tomar mais uma”, um engov antes outro depois que irão modificar o quadro. E nem tão pouco a ressaca não alcoólica (que é o meu sintoma) vá se desfazer com vãs filosofias.
No mais, é esperar que ela se dilua por si mesma. E que ao fim de alguns dias se possa abrir o armário, pendurar a fantasia e buscar vestimentas adornadas de bom senso, otimismo, sobriedade e esperança.
Assim vestida, finalmente, dar início à caminhada do ano novo que nos espera.

sexta-feira, 4 de março de 2011

Outros Carnavais


Walnize Carvalho .

Nesta crônica de hoje vou embarcar no saudosismo...Saudosismo sim! E por que não?
Temos tendência a rotular de saudosista a pessoa velha, ultrapassada, insatisfeita ( quase sempre com o presente) e que insiste em querer viver no passado.
E há quem diga até que “quem vive do passado é museu”...
Creio que (retomando a idéia inicial) saudoso é quem denota saudade e – convenhamos – que privilégio ser tomado por este sentimento (saudade) que, além de ser um belo estado de espírito, é palavra que só existe na língua portuguesa!...
Mas, vamos lá!
Hoje é tempo de carnaval. Com ou sem fantasia ; animado ou indiferente não há como deixar de saber notícias dele...
Em tempo de boas lembranças me vêm à mente outros carnavais: os que vivi e os que ouvi contar... Tempo de corso nas ruas, fantasias, blocos, cordões, clubes sociais apinhados de pessoas descontraídas e felizes.(será que alguém se lembra – como eu - da expressão “tríduo momesco”?)
Em idos de 58 ( pesquisei no ‘ Campos depois do Centenário “ vol. 2 – Waldir Carvalho) consta que : “ Na segunda feira gorda desfilaram os blocos “ Felisminda minha Nega “ , “ O Prazer das Morenas “ como os ranchos “As Magnólias “ e “ Chuveiro de Prata“ .A animação dos bailes ficava por conta dos Plutões , Saldanha e Automóvel Clube Na boca de todos, em qualquer canto da cidade (nos clubes ou nas ruas) as marchas-rancho se tornavam hino.
A cada ano ,com tempo de antecedência aprendíamos as músicas que seriam tocadas e cantadas a exaustão.Exaustão? E quem demonstrava cansaço, ainda que ele se fizesse presente?
Quantas gerações conhecem e cantam até os nossos dias: “Bandeira branca”, “Jardineira”, “Cabeleira do Zezé”, “Colombina”, “Mamãe eu quero” e tantos outros sucessos!
É prova inconteste que o que é bom perpetua e feliz de quem não tem culpa de gostar do que é bom!
Havia no ar uma expectativa com a chegada do carnaval desde a compra de fantasias a ingressos para os bailes nos clubes, como também gerava ansiedade poder ir às ruas ver ou participar dos desfiles populares.
Tudo girava em torno da alegria garantida nos “três dias de folia”.
E quando estes chegavam... não havia quem não fizesse valer os versos da canção: “Deixei a tristeza lá fora/ mandei a saudade esperar/ hoje eu não quero sofrer/ quem quiser que sofra em meu lugar”.
Mas... sem nostalgia: são outros carnavais!

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Cumplicidade



Walnize Carvalho

É um período de diários encontros.É tempo de férias.
E assim... ao cair da tarde, o prazeroso ritual se repete: Três grandes amigas passam juntas, horas agradáveis.Duas delas, se dirigem à casa da terceira, que ao pressentir a chegada das primeiras, logo avisa com voz de alegria e ansiedade: - Arrumem as cadeiras da varanda...E - enfatiza - ... no lado da fresca, que já estou indo!
Minutos depois a dona da casa aparece trazendo nos braços e mãos (quanta habilidade!) variadas guloseimas, (potes de biscoitinhos sortidos, bolo de aipim, broas de milho e até doce de jenipapo!) para o lanche da tarde.Ajeita-os sobre a mesa e retorna com líquidos variados (leite, suco de caju e café coado na hora). Tudo por ela organizado é hora da saudação às “visitas” que é feita de abraços e beijos fraternos.Quem assiste de fora (caso passe alguém pela rua) pensa que se trata de reencontro de pessoas queridas, que de há muito não se vêem.Ledo engano!A afetividade é repetida diuturnamente.
Regado a tudo isso, a conversa que rola solta e descontraída. Trocam experiências, fazem confidências. Falam de assuntos domésticos, do tempo, de novela, de moda, dos modos, das novidades, dos acontecimentos, de culinária, da vida vivida, de fatos que a memória insiste em lembrar, dos filhos, dos netos e...dos netos!
E como entre elas, há o pacto legitimado pelas alianças do sangue, toda a “troca de ideias” é cercada de autenticidade e sinceridade. Há um forte comprometimento com as marcas da origem (a criação que tiveram, os valores adquiridos...) fazendo com que o eixo central do bate papo seja a família.
Dia desses uma delas se lembrou da frase primorosa da escritora Rachel de Queiroz: ”Famílias, a Natureza as faz, mas a gente as arruma ou organiza”, o que fez rolar uma lágrima furtiva dos olhos da outra, denotando melancolia.Silêncio.A terceira, quebrando o clima saiu-se com essa: -Tem gente aí que prometeu parar de pintar os cabelos aos cinquenta...e já está a caminho dos sessenta e até agora nada!...
Gargalhada geral!
E tem sido assim: Uma fala, outra escuta e mais outra retruca... E porque não há compromisso com o correr das horas, afinal - férias são férias - debruçam-se em lembranças felizes, que vão desde a infância ,em que dormiam cada uma em sua caminha . Assim, recorda uma delas, que a mãe as abençoava e saía do quarto, tratavam de juntá-las, para que a mais velha das três contasse historinhas...
Em seguida, aportam na juventude e em meio a risos nervosos falam dos bailes no Clube, bailes estes acompanhados dos pais .Uma delas se lembra de que quando o pai se postava de pé era a senha: hora de ir embora.E ela, pensando ganhar mais alguns minutos se escondia no vestiário! Que ilusão!...
Anoitece. Todas se lembram que é hora de retornarem aos seus hábitos individuais. Despedem-se. Duas seguem para suas respectivas casas. A que fica chega ao portão e grita:- Amanhã à tarde,tem doce de carambola com queijo da roça!...
(dedico esta crônica às queridas irmãs –Zedir e Zalnir - que neste fevereiro(21) e (25) respectivamente, aniversariam.)

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Descoberta




Walnize Carvalho

Cobria os olhos
Com óculos escuros
- precisava mascarar.

Escondia os braços
Com traje abotoado
- necessitava ocultar.

Tingia os cabelos
Com tons dourados
- desejava disfarçar.

Vestia todo o corpo
Com túnica longa.
- queria camuflar.

Mas...
A mão despida,
Com caneta ágil nos dedos,
obedeceu
ordens interiores.

E o coração pulsando
A mente impulsionando
Não pude mais dissimular.

A Poesia
Desnudou
A minha alma.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Bizarro


Walnize Carvalho

Quando ela se anunciava (e final de semana geralmente era quando a “danada” a pegava de jeito) sai de baixo ... Do Carmo ficava impossível e com um estranho desejo.
Era a vontade de sentir Tristeza. E tinha que ter tristeza para justificar a tristeza.
Arranjava um grande motivo para deixá-la chegar ... e ficar.
E assim, lenço na cabeça, avental, pano de chão, balde e vassoura se dava a faxinar a casa. Para ela uma sensação ambígua de humilhação e glória. Suor pela face, joelhos no chão, limpava canto por canto. Verdadeiro auto flagelo.
Olhava as unhas pintadas na sexta-feira já totalmente destruídas. A escova progressiva já dava sinais de ter que ser refeita (gastara um bom dinheiro).
Respiração ofegante, coração exultante.
Como estava só em casa aproveitava para ouvir os velhos sucessos musicais do tipo “Ninguém me ama; ninguém me quer”. Cantarolava ... E bem lá no fundo de seu ouvido o refrão da “Escrava Isaura” fazia ressonância: “lerê, lerê, lerêlerêlerêlerêêê”...
Afinal, movida de tamanha felicidade de ter conseguido o seu intento – sentir Tristeza - jogava-se na poltrona (após banho tomado), fechava as cortinas da sala e começava a chorar, gargalhar, soluçar.
Vencida pelo cansaço, dormia abraçada à “visita” como um anjo sem culpa.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Foto mensagem



Na manhã ensolarada o matinho verde se esparrama sobre a areia como a banhar-se dos raios solares...

sábado, 29 de janeiro de 2011

Mergulhos no mar da memória


Walnize Carvalho

Verão de infância distante.
A cena aparece límpida perante meus olhos : eu, primos e irmãs ( após café da manhã) trocávamos rapidamente os trajes de dormir pelos de banho de mar.E nem consultávamos o tempo! O importante era não perder tempo...embora ficássemos de guarda até que um adulto chegasse (ou melhor apontasse na esquina) para que –enfileirados- tal atletas em competição, corrêssemos para nados e mergulhos.E não havia disputa e nem espera de medalhas...Éramos,tão somente ,crianças felizes e despreocupadas curtindo férias na praia do Farol de São Tomé.
Com chuva ou com sol (de preferência por dias ensolarados, para que os adultos –os tomadores de conta- ficassem menos extenuados ) lá estávamos nós, no nosso “compromisso” diário.
E ficava difícil - mães e tias - conterem a fúria (não do mar bravio) mas de nosso impulsivo destemor naquelas horas de genuína felicidade.
Sob as barracas, (em cadeiras ou esteirinhas) os adultos admiravam o balé quase que sincronizado da criançada. Os meninos davam braçadas, “pegavam jacaré” com os braços esticados (ainda não existiam pranchas), deslizavam em meio as ondas indo até à beira mar, o que fazia com que muitas vezes “atropelassem” os que por ali estavam . Já as meninas se esmeravam em mergulhos e mais mergulhos...o que fez com que eu recebesse o título de “tainha”(tainha - um peixinho- não confundir com rainha ) do saudoso tio Zé...
A saída das águas só se dava após insistentes acenos e gritos dos mais velhos ou quando eles entravam no mar e exigiam nossa retirada.
Em tempos atuais tenho pelo mar (principalmente, o da praia campista e lugar escolhido de férias das netas) admiração e respeito. Gosto de postar-me à sua frente e meditar. É como estivesse em um santuário a ouvir cantos gregorianos que são substituídos pela melodia do bater de suas ondas.
Perante gigantesca beleza extraio lições de sabedoria para um viver harmonioso: ora mergulho fundo em busca de soluções para os desafios; ora mergulho raso quando assumo minhas limitações.
Embarco, para melhor definição, nos versos da canção: “A vida vem em ondas, como o mar /num indo e vindo infinitos” .