sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Velha Companheira


Walnize Carvalho

Com o término do ano preparo-me para a sua despedida. E, confesso, já estou com saudades dela.
Olho-a com ares de ternura e uma certa melancolia me invade.
Vejo o seu jeito cansado, desgastado, amarrotado pelo tempo – afinal, um ano se passou – e ela ali, firme, guerreira, acima de tudo, velha companheira.
Sem ser volúvel (mas é necessário que assim o faça) irei substituí-la por outra. É o ciclo da vida.
Com ela, nestes doze meses, dividi tristezas e alegrias.
Arquitetei planos.
Realizei sonhos.
Deixei em sua face sinais de lágrimas e até marcas de batom.
Impregnei-a de frases lidas, ouvidas e até criadas por mim.
Empenhei com ela (em vão) a sentença de que “não se deixe para amanhã o que pode fazer hoje”. Mas, muitas vezes, dada às circunstâncias coisas ficaram para... depois de amanhã.
Ela, compreensiva e silenciosa, sempre entendia os meus anseios.
Minhas frustrações? Passei-lhe todas.
Derramei sobre seus ombros várias emoções vividas e ela as recebia com entusiasmo.
A simbiose afetiva transcorria de forma envolvente e profunda.
Verdadeira entrega.
Como autêntica arquivista documentou tudo o que eu lhe passava sem contestação.
Agora, aqui fico a admirá-la e esquecida de mim leio em seu semblante minha história desenhada.
Revejo no tempo o meu aprendizado e constato que foi enriquecedor estar em sua companhia.
Ela está de partida. Cansada, mas com sentimento do dever cumprido, pois mais do que companheira foi minha cúmplice.
Agüentou, serenamente, confissões e desabafos.
Com o término do ano preparo-me para despedir-me da minha AGENDA .
Uma amiga? Uma companheira? Tudo isso. Mas, acima de tudo, a reprodução de mim mesma.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

E chegou o Natal...



Aproveito o desenho da neta Valentina - as crianças e sua inocência nos renovam - para desejar a amiga Ana e aos que passam os olhos pelas minhas postagens uma Noite feliz!

Para sempre Papai Noel


Walnize Carvalho
(da lembrança do meu pai)

A menina entreabre os olhos.
Vê que vem do cômodo ao lado de seu quarto, uma luminosidade.É manhãzinha. Olha para o lado. Suas irmãs estão dormindo nas caminhas enfileiradas.
Levante-se, sorrateiramente, e vai ate aonde a luz chama. La está ele –seu pai- os apetrechos de barbear :bacia, pincel, espuma, gilete.
Prepara a espuma e desenha no rosto a barba – barba de Papai Noel.
A menina chega. Debruça-se sobre o parapeito da pia e fica a admirar aquele que tantos anos repete o ritual e transforma no seu herói preferido.
Espuma branca ... lembrança pura.
A mulher entreabre os olhos.
Sai á rua na manhãzinha. Passa por uma barbearia.Espia um senhor sentado,toalha no pescoço,cabeça recostada.
O barbeiro prepara o rosto dele. Mesmos apetrechos de barbear. Mesmas lembranças.
Modela naquele rosto cansado a barba de espuma branca.
O Papai Noel volta a bailar na mente daquela mulher.
O momento é mágico e por segundos uma nuvem de paz envolve o ambiente.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Para Ana Paula


"Eu encheria de estrelas
uma cesta bem grande,
se pudesse colhê-las...

Escolheria com carinho
e o máximo cuidado
(será que elas se apagam
ou se quebram?!...)
as mais brilhantes,
as que ficam mais perto
do trono azul de Deus...

Depois, iria à sua casa,
toda cheia de brilhos,
como a primeira distribuidora de estrelas,
de estrelas vivas e genuínas!

E, num arranjo cuidadoso
de decorador diplomado
deixaria seu quarto
ou,se prefere, a sua sala
igual a um grande céu
tendo o maior cuidado
de fazer de tal modo o meu arranjo,
que ficasse
bem claro e definitivo.

Depois, me esconderia
atrás da cortina
a fim de ver e curtir
aquele brilho nos seus olhos,
ao descobrir o meu presente:
-o céu trazido assim
pra dentro do meu quarto!

Mas...
que adianta sonhar?
Estrelas são estrelas
e nunca poderão baixar à terra...


No entanto,Amiga,
se você
olhar hoje à noite, pela janela
eu juro, que verá
algumas estrelinhas
piscando pra você
como a dizerem:
"Uma ave me contou que hoje é seu dia!
Meus parabéns!
FELIZ ANIVERSÁRIO!"

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Denominações afetivas



Walnize Carvalho




Nunca tive apelidos... Aliás, nem eu e nem minhas irmãs. Nossos nomes nasceram da junção de sílabas dos nomes de nossos pais.
Parece que respeitando o poeta (afinal, papai também escrevia sílabas metrificadas) a coisa assim se fez.
Escrevendo a palavra papai (que não é apelido), assim como mamãe, titia, mana, dindinha, vovó, bisa e outras que surgiram da linguagem das crianças, percebo que estas denominações afetivas incorporaram ao chamamento e, na maioria das vezes, substituem o próprio nome das pessoas.
Sei da história de um neto que ficou surpreso ao ouvir alguém da casa chamar sua avó pelo nome e contestou: - Vovó é vovó, não é Maria!...
Como também ouvi (não me contaram) uma esposa chamar o marido de pai e este chamá-la de mãe deixando atônito um distraído senhor que não captou o código do casal.
Contando um pouco de mim, até que já ensaiaram chamar-me de Wal (não vingou) e fui “Marta Rocha” em criança pela semelhança da cor dos olhos (título que ser perdeu no tempo).
Não me frustro de não ter apelidos, uma vez que tenho mãe, irmãs, madrinha, afilhados, filhos e netas que de tanto mencioná-los já me premiam com a alcunha de coruja.
Pensando bem, apelidos são formas de demonstrar carinho mas também, quase em sua maioria, traduzem um jeito jocoso de desqualificar o outro.
Na verdade, o que me preenche e até adoto como sobrenome é ser referência para o próximo.
Ser chamada de amiga (quando você se empenha por merecer); ser considerada um ser especial; estar tatuada no coração do outro... é bom demais!
Imagina alguém confessar: - Gosto de lhe preservar. Ou então: - Você é uma espécie em extinção. Ou num arroubo dizer-lhe: - Você é uma reserva moral! Chique, não é?!
Pode parecer chinfrim, mas ouvir ao telefone uma amiga confessar: “Você é como o sol: não aparece todos os dias, mas eu sei que ele existe”. Você se acha, no mínimo, uma superstar!
E que tal encontrar na rua com uma velha conhecida e ela lhe saudar: - Menina, como está sumida! Este “menina” faz você ganhar o dia ou, quem sabe, anos de vida.
Há, é claro, alguns exageros. Exemplo típico vem de algumas atendentes de telemarketing que adoram nos chamar de “querida”. Argh!
Quer elogio mais animador (?!?) alguém chamá-la de “fofinha” quando na verdade seu manequim já está na casa dos 46?
O certo é que gestos de ternura valem mais do que qualquer honraria ou título.
E quando bem empregados atuam como um cafuné na alma.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

História em quadrinhos


Walnize Carvalho
Manhã de sexta-feira.
Ida ao shopping.
Entre pessoas apressadas, curiosas, mal-humoradas, com sacolas, com crianças, cenhos fechados, observadoras, casais de namorados... Ela passa, a mulher.
Observa o olhar faminto. Uns com fome de guloseimas, outros de consumos materiais.
E como o lugar é propício para diversão, lazer e prazer, flagra sorrisos de felicidade: da moça no balcão da loja olhando as fotos reveladas; da jovem na livraria recebendo um livro de presente; da menina comprando sorvete de três sabores; da senhora pesando na balança da farmácia.
E mais a alegria estampada no senhor sorvendo vagarosamente o café expresso; do menino jogando videogame; do rapaz assistindo esporte na tevê da loja; do idoso conferindo a tabela de promoção de remédios...
Continua andando.
Um “flash” a faz parar. Uma pessoa a observa.
Está diante de um espelho. A mulher e a escritora frente a frente completam os personagens da história em quadrinhos de uma revista diária.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Elas estão crescendo...


Walnize Carvalho
Lembro-me bem, com que carinho, falei sobre elas : “As meninas circulam meu dia- a - dia. Jogam-me na roda, no centro da roda, na berlinda. A romântica puxa-me pela saia, quer que abre gavetas, escreva emoção sentida em qualquer folha de papel.A vaidosa coloca-me frente ao espelho,quer me ver bem - olhos brilhantes - batom bem retocado nos lábios .A organizada olha o relógio, ajeita a roupa, combina cores de calçado e blusa ,vai à luta cumprir jornada e é a mesma que chega comigo ao lar e insiste em brincar de “casinha”.A desprendida (cabelos ao vento) corre lépida para ver o mar, o luar,ou alguém para falar...agitada deixa-me quase sem ar! Mas, há a menina assustada, que vez por outra vem visitar-me na calada da noite...se achega de mansinho, pede-me colo e uma historinha que a faça dormir...E assim, brincando com elas de “bem-me-quer e mal-me-quer” encontro no dia-a-dia minha essência de Mulher!...”
E, de repente, dia desses percebo o desassossego .A um canto as cinco meninas cochichavam dando-me a nítida impressão que falavam a meu respeito.
Aproximaram-se de mim e novamente colocaram-me na berlinda.A desprendida tomando as dores das outras,iniciou as reivindicações: -Não somos mais crianças! Queremos liberdade!Eu, por exemplo, estou entediada! Você - apontou-me- só quer saber de viagens virtuais! De vez em quando,vamos a um cineminha com a condição de que eu fique com modos de menina comportada. Não me leva para ver o mar, o luar ...
Foi a deixa para que a vaidosa entrasse em campo:-Para onde foram nossas idas constantes ao salão de beleza, às compras nos shoppings?
Bastou para que a organizada se manifestasse : -Aposentou se do trabalho e da vida social também? Até as nossas brincadeiras de “casinha” se tornaram enfadonhas de tão rotineiras!
A assustada começou a cantarolar: “Eu perdi o medo/o medo da chuva!...” E acrescentou,com ares de superioridade: -Nada como um bom livro de cabeceira para me levar ao sono!
Sem ação e sem resposta fiquei por ali, pensativa, durante alguns minutos.
Levantei-me da cadeira e me preparava para uma ducha fria, quando alguém enlaçando-me pelo pescoço sussurrou aos meus ouvidos: - Quero que fique tudo como está! Serei sempre sua companheira!
Saímos abraçadas e emocionadas em busca de papel e caneta: eu e a menina romântica.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Visões do apartamento



Walnize Carvalho
Na janela, mulher empilha folhas de papel:
- inspiração.
Na calçada, homem empilha caixas de papelão:
- ganha-pão.
Na praça, velho empilha cartas de baralho:
- diversão.
Na rua, guarda empilha multas de trânsito:
- infração.
No bar, rapaz empilha engradados de cerveja:
- comemoração.
Na loteria, senhora empilha contas a pagar:
- inquietação.
No templo, jovem empilha folhetos:
- conversão.
No jornal, corpos empilhados em mais uma chacina:
- mundo cão.

domingo, 14 de novembro de 2010

A dança vesperal


Walnize Carvalho

Aproveitando o feriado resolvi ir até Niterói.
Primeira providência: ligar para a neta mais velha e marcar encontro.
Confirmada a ida ao shopping, preparei-me para descer à rua.
Mirei-me no espelho. Escolhi roupa, calçado, bijuteria e cor de batom,pois a menina gosta de me ver arrumada.
Olhei para o relógio. Cinco da tarde. Apressei-me. Desci. Observei que o vento enviesado era prenúncio da tempestade vespertina.
Ao por o pé na calçada ouvi grito de alerta: - Sujou! Olhei à volta. E, como num estalar de dedos, as calçadas da rua central ficaram limpas .
Olhei o céu. Não era a chuva anunciada, que fazia as pessoas se apressarem. A tempestade era outra.
Assim, como pássaros, habitualmente, voam desencontrados ao ouvirem tiros a distância, vindos dos morros da cidade, assim ,os camelôs faziam .Cada qual corria para proteger suas mercadorias ao pressentiram a chegada dos fiscais .
O grito era de um dos vendedores, que alertava seus colegas da presença dos moços fazendo com que todos saíssem em “revoada” .
Carregavam caixas na cabeça, sacolas nos braços, cabide e tabuleiro nos ombros. Deslizavam com carrinhos de feira, por entre carros apressados.Mercadorias variadas que iam desde relógios, canetas ,bijuterias ,bolsas, lenços , maquiagens, dvd’s, pilhas, brinquedos até filhotes de cachorro .
As calçadas ficaram livres. As pessoas recomeçaram a circular. Por uns instantes, fiquei parada. Dei alguns passos e posicionei-me em frente ao Teatro Municipal de Niterói.
Ouvi uma melodia suave vinda do chão, em meio a folhas secas, filipetas de propagandas, pontas de cigarro, papéis de balas, que o corre- corre urbano se incumbe de servir como desculpa para a desatenção e falta de educação dos transeuntes.
Abaixei-me e apanhei o objeto perdido: uma caixinha de música, onde uma bailarina rodopiava... rodopiava...
Segurei-a entre as mãos .Olhei à volta à procura do dono . O camelô já ia longe.
Olhei para o alto.Na fachada do prédio do teatro, um letreiro anunciava :
COMPANHIA DE DANÇA
SÁBADO – 19 HORAS
ÚNICA APRESENTAÇÃO .
Um sorriso melancólico estampou –se em meu rosto .
Acabara de assistir a um balé de todos os dias, a um espetáculo diário de grande metrópole.
Do outro lado da calçada, a neta me avistou.Saltitante veio ao meu encontro.

Bonecas


Walnize Carvalho
O dia chega: nove horas.
Rua movimentada.
Em uma esquina, uma senhora sentada,pacientemente, transforma retalhos coloridos em vestidos de boneca. Feitos de fitinhas, miçangas e bordados ,por certo, acalentaram sonhos de criança e, quem sabe, a lembrança dos seus também...
A noite chega: Vinte e uma horas.
Rua deserta.
Na mesma esquina ,um homem travestido.
Em trajes de brilho espera, impaciente, que lhe venham fazer companhia e dar vazão aos sonhos seus.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

A freira e o guarda chuva

Walnize Carvalho
A mulher saiu à rua.
A tarde chuvosa não lhe dava assunto para crônica. Caminhava devagar pela rua vazia.
Seguia pela calçada fugindo da água e dos “ banhos” de lama provocados pelos motoristas dos carros que passavam.Carros de vidros escuros e fechados .
Ela e seu guarda chuva preto.
Ao dobrar a esquina, o vento sul envergou o seu protetor.
Nesse momento, cruzou por ela na calçada, uma freira: hábito preto, sandálias franciscanas .
O mesmo vento que fazia o seu guarda chuva rodopiar, levantou o véu da freira.
Por um momento, um balé sincronizado : A freira .O véu. A mulher. O guarda chuva.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Semelhanças


Walnize Carvalho

A árvore parece doente e só.
A pintura branca até a metade do seu caule assemelha-se a uma bota de gesso.
Sua coluna alquebrada e suas folhas ressecadas diagnosticam
osteoporose e doença de pele.
Solitária em um jardim de casa abandonada (casa de veraneio
fora de temporada).
Aguarda a visita de pássaros no fim da tarde, que virão para se
abrigar em seus galhos e lhe sussurrar cantos melodiosos.
A cena remexeu minhas lembranças.
Nitidamente me veio a imagem do velho ,que na infância vi no Asilo. Chamou-me e contou-me histórias.Retribuí com sorrisos e afagos.
A árvore.O velho.A criança.O pássaro: sutis semelhanças.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Poema para a nossa presidenta


500 anos esta noite

Pedro Tierra


De onde vem essa mulher
que bate à nossa porta 500 anos depois?
Reconheço esse rosto estampado
em pano e bandeiras e lhes digo:
vem da madrugada que acendemos
no coração da noite.

De onde vem essa mulher
que bate às portas do país dos patriarcas
em nome dos que estavam famintos
e agora têm pão e trabalho?
Reconheço esse rosto e lhes digo:
vem dos rios subterrâneos da esperança,
que fecundaram o trigo e fermentaram o pão.

De onde vem essa mulher
que apedrejam, mas não se detém,
protegida pelas mãos aflitas dos pobres
que invadiram os espaços de mando?
Reconheço esse rosto e lhes digo:
vem do lado esquerdo do peito.

Por minha boca de clamores e silêncios
ecoe a voz da geração insubmissa
para contar sob sol da praça
aos que nasceram e aos que nascerão
de onde vem essa mulher.
Que rosto tem, que sonhos traz?

Não me falte agora a palavra que retive
ou que iludiu a fúria dos carrascos
durante o tempo sombrio
que nos coube combater.
Filha do espanto e da indignação,
filha da liberdade e da coragem,
recortado o rosto e o riso como centelha:
metal e flor, madeira e memória.

No continente de esporas de prata
e rebenque,
o sonho dissolve a treva espessa,
recolhe os cambaus, a brutalidade, o pelourinho,
afasta a força que sufoca e silencia
séculos de alcova, estupro e tirania
e lança luz sobre o rosto dessa mulher
que bate às portas do nosso coração.

As mãos do metalúrgico,
as mãos da multidão inumerável
moldaram na doçura do barro
e no metal oculto dos sonhos
a vontade e a têmpera
para disputar o país.

Dilma se aparta da luz
que esculpiu seu rosto
ante os olhos da multidão
para disputar o país,
para governar o país.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Com jeito de mulher




Walnize Carvalho

Não foi puro, creio eu, que Deus ao criá-la batizou-a com nome feminino: NATUREZA.
Bela, quase sempre. Silenciosa, às vezes. Generosa, outras tantas. Caprichosa, quando quer. Exibicionista. Determinada. Habilidosa. Espontânea. Contraditória. Versátil. Dócil. Rebelde. Voluptuosa.
Foi assim que pensei, ao passar naquela tarde chuvosa de inverno, pela BeiraValão e vi destacando-se entre os ipês floridos, uma imensa árvore coberta de dourados brilhos.
Como uma bela e desejada mulher, ali se fazia presente, contrariando seu tempo de florescer (primavera). Com pujança dava um show de exibicionismo com tempo marcado para “retirar-se de cena” e usar trajes comuns.
A Natureza e sua suntuosidade.
E continuei meditando: quantas espécies habitam o Universo (rios, mares, florestas, pássaros, cachoeiras, etc. ...) seguindo a ordem natural estabelecida, muitas vezes apresentam espetáculos diários sem o olhar do Homem?!?...
A Natureza e sua espontaneidade.
Sigo a caminhada. Mais adiante reflito: e as catástrofes, as devastações dos rios e mares?!?...
A Natureza e sua agressividade.
O pensamento gira: e quando nas redes dos pescadores vêm saltitando sortimento de peixes e crustáceos?!?...
A Natureza e sua generosidade.
Paro o trajeto. A chuva cessa. O sol aparece por entre as nuvens. No céu desenha-se um portentoso arco-íris.
A Natureza e sua versatilidade.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Devaneio


Devaneio

Walnize Carvalho

Imaginem se pudéssemos chegar ao balcão de uma loja pedindo: - Embrulhe em papel de presente (o mais vistoso) uma caixa recheada de Paz. Ou se ligássemos para um hortifruti solicitando: - Separe duas dúzias (bem fresquinhas) de Harmonia e traga no endereço tal. Ou se fizéssemos (via Internet) uma encomenda urgente de três pacotes de Felicidade?!? No mínimo, significaria devaneio ou surto de loucura! Mas se somos todos “loucos” por esta trilogia ( paz, harmonia e felicidade ) seria uma conquista e tanto. Seria?
Convenhamos, que se nos fartássemos de tais iguarias em tamanha proporção estaríamos fadados à indigestão, tamanho peso no estômago e que antiácido algum daria jeito.
A escolha sensata é a de sempre saborearmos desses doces sentimentos enumerados, em porções balanceadas e, se possível, mescladas com amargos sabores (Dor, Tristeza e Saudade) o que torna a refeição – digamos assim – agridoce.
Se pensarmos bem, concluiremos que a vida nos oferece um banquete de cardápio variado. Só nos resta optar pelo “prato” a ser digerido.
À cada dia, desde o café da manhã pesamos na balança do bom senso nossas decisões. Devemos observar com cautela, qual o caminho a seguir: ou renunciamos a um projeto tão sonhado ou persistimos nele até que se concretize.
Muitas vezes, por açodamento, procuramos o caminho mais curto, mas que nem sempre nos leva a lugar algum.
De outra feita, somos tomados por forte indecisão. É como que chegássemos a um self service; parássemos diante de variada gastronomia e nos indagamos: feijoada ou massa?...
No “bate e rebate” do cotidiano estamos para perder ou ganhar; lutar ou resignar; nos reprimir ou nos libertar.Não é esta a receita de um bem viver?
Há dias em que o choro nos lava a alma. Em contrapartida, há momentos em que o nosso riso em excesso revela uma falsa euforia.
Repetimos à exaustão: “Todos temos o direito de ir e vir”. Mas sabemos sempre quando ir ou quando vir?...
Será que avaliamos com precisão quando é a Razão ou o Coração que deve falar mais alto? ...
São estas indagações que dão tempero a nossa vida. Concordam?
Retomo ao devaneio do início da crônica: ter por inteiro a Paz, a Harmonia e a Felicidade.Pura ilusão! Elas nos são servidas em fatias!...
O interessante é nestes momentos cada um de nós: apaziguar o coração, harmonizar o espírito e se felicitar com os consagrados versos : “Felicidade...Esta árvore milagrosa que supomos/ arriada de dourados pomos/ existe sim,/ mas nós não a alcançamos/ porque está sempre onde a pomos/ e nunca pomos onde nós estamos”.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Conto de Jardim: Equinócio

Aquela manhã de setembro estava insuportável. Desde que voltara ao trabalho, sócia numa pequena empresa, as sextas-feiras eram um tormento.
Dois dos colegas nunca se entendiam e perdiam um tempo enorme tentando provar que estavam certos, ela tão sonhadora na vida pessoal era extremamente prática no trabalho e se via sempre forçada a tomar as rédeas da situação.
Enquanto brigavam ela com uma enorme dor de cabeça se esforçava para terminar os relatórios semanais e deixar pronta a pauta da nova semana.
Aviso do porteiro, encomenda para ela.
Começou a rasgar o papel na sala comum aos sócios, se deteve assim que viu o nome da loja na pequena caixa. Foi para a sala privada e sorriu quando terminou de abrir. Lingerie preta com renda francesa. Com certeza ele havia visto seus olhos cobiçando as peças quando passaram em frente à loja.
Vivem o doce desequilíbrio dos sentimentos intensos.Separam-se e juntam-se, perdem-se e acham-se.
Divagava sobre o seu amor em meio aquele caos de papéis e contas.
Som de mensagem. Um SMS: Te aguardo...agora!!
Deixa um bilhete na secretária e sai apressada.
Ele a recebe com um sorriso e um beijo demorado.
No carro as botas de montaria castanhas , uma cesta enorme, mala.
Ia ser "raptada" para a serra. As crianças estavam na casa dos tios, ele avisava.
Caixa de presente na mão, deixa o vento bater na cara.
Equilibram-se nas primaveras e outonos, quando as almas milagrosamente se fazem harmônicas.
Acordam junto com o sol e vão colher o dia. Andam agora a cultivar auroras.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

O bambolê amarelo


O bambolê amarelo
Walnize Carvalho

Dia da criança!...Tempo de lembranças da infância...
Bola. .Brinquedo. Presente. Passado. Bambolê.Um bambolê amarelo.
Assim foi que era tardinha. .
Pela rua do Mercado (Oliveira Botelho) que fica em frente à minha casa de infância, lá vinha ele(meu saudoso padrinho em minha direção. A novidade nas mãos.
E eu, a afilhada que tanto amava, naquele dia recebi o presente: o bambolê (brinquedo que naquela época era novidade )
Ainda é viva a lembrança.: A calçada da rua do Gás; as irmãs ; as meninas da vizinhança e, eu -dona do círculo dourado – administrava o empréstimo à garotada.
Alegria...Inocência... Reminiscências...
Guiada pelo sentimento abri o portão de casa e postei-me na calçada.
As lembranças rodam .Redemoínho.
Transformo–me na menina que fui : coloco as mãos na cintura.Fecho os olhos e giro...giro...giro.
Um bambolê imaginário circula em meu corpo uma imensa saudade da infância que se foi na roda da vida.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

O pulsar da cidade


O pulsar da cidade

Walnize Carvalho

Na banca de revistas,
Grupo de senhores
Filando
Leitura de jornais.

No umbral da janela,
Roda de pássaros
Disputando
Farelos de pão.

Na porta da igreja,
Cacho de velhinhas
Rezando
Oração matinal

No meio da praça
Conjunto de transeuntes
Ouvindo
Pregação do vendedor.

Na entrada da repartição,
Aglomerado de rapazes
Pleiteando
Emprego definitivo.

No meio do Calçadão
Homens comuns,
Executivos,
Comerciantes,
Várias classes sociais
Em torno do assunto da semana:
- Eleições em todo o país.

A cidade pulsa.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Liberdade maior


Liberdade maior

Walnize Carvalho

Queria ser livre
Correr mundos
Viver!...
Até que um dia
(que dia!)
Uma ventania de fim de tarde
Satisfez
O seu desejo.
Que felicidade!
Nos braços do vento
Foi em busca
Da vida sonhada
Da viva
Somente vivida
Pelos passarinhos
Que vinham pousar na árvore em que morava.

E
Lá se foi ela.
Feliz
Correu quintais
Atravessou muros
Percorreu quintais...

Até que...
Um vento maroto
A fez cair
No rio que cortava a cidade.
Levada pelas águas
Se foi para
um mundo
liberto
um mundo
distante
pra não mais voltar..

-Esta é a história de uma folhinha que um dia se foi da árvore do meu quintal.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Manhã em Flor



Nossa amiga Jane Nunes propôs e nós acatamos sem hesitar. Para o aniversário da Walnize uma blogagem coletiva.

Para quem semeia poesia na bagunça do dia-a-dia desejamos um dia florido como seu sorriso...

Dos seus amigos do Sociedade Blog, Estou Procurando o que Fazer, Quarto de Segredos, Sabor e Histórias e Blog do Núcleo.

“Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!”

Florbela Espanca



Outono, inverno, verão, primavera na vida. Longe de essa ser uma digressão climática, mas uma reflexão de vida com um V maiúsculo.

Sempre ouvimos a expressão “flor da idade” em relação à juventude, aos nossos vinte anos. Será essa a primavera florida da vida? Pode ser até que seja para alguns, mas acho difícil.

Acho que os vinte anos são os nossos verões: tumultuados, intensos, sufocantes e tempestuosos. Penso em primavera como algo muito mais aconchegante, suave, sereno, doce, florido, quente, mas sem sufocar, ensolarado, mas sem queimar.

Primavera entra na vida devagar, com sua luz pelas frestas das janelas, por vezes ainda fechadas. Sutilmente espalha o sol das manhãs sem ofuscar os olhos e traz um sopro de vida pra dentro da penumbra.

Na primavera há lugar para brisas e ventos fortes, calor e friozinho (na barriga), insônias (sonhos de olhos abertos) e sonos tranqüilos. Nessa estação há lugar para muita coisa, mas tudo mais natural, como o rio em seu inexorável caminho para o mar...

Texto de Ana Paula Motta

Clique AQUI

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Vida de artista


Vida de artista

Walnize Carvalho



A menina usa maquiagem
Pensa que é modelo.

A senhora veste minissaia
Julga ser atriz.

O menino capricha no modelito
Se acha o galã das oito.

O senhor pinta o cabelo
Se diz jovem de quarenta.

O jovem adormece com ipod no ouvido
Demonstra cansaço e tédio.

O velho ouve som alto no carro
Se sente moderno.

O homem veste roupa de etiqueta
Supõe ter poder.

A mulher compra bolsa falsificada
Crê poder ter.

O adulto brinca de vídeo game
Acredita ser criança.

A criança fala em política
Imagina ser adulto.

E no melhor estilo de Pirandello
“Assim é, se lhe parece”...

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Tarde de Sábado


Tarde de sábado


Walnize Carvalho

Naquela tarde de sábado
Sábado ausente em distância
Sábado presente em pensamento
Eu queria
Ter ouvido tocar o telefone
- tocar uma única vez.

Eu queria
Atender com aquele “alô”
Apagado
Sem calor
E
Ouvir do outro lado
Aquele “alô”
Vivo
Animador.

Naquela tarde de sábado
Os minutos
As horas
Se passaram...

Esperei
Ouvir sua voz
Esperei tanto
Para lhe dizer
Das coisas velhas
Das coisas novas
Da coisa eterna: o meu Amor

Eu queria tanto...

Mas
Aquela tarde de sábado
Fez do sábado
Um sábado qualquer.

E da espera de ouvir
A espera de esperar...

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Noite de luar


Noite de luar

Walnize Carvalho






Noite de luar
Minh’alma
Uma noite sem luar.

Ônibus vão
Ônibus vêm
Vazios de você.

Uma criança ri.
Ri pra mim
Ou
De mim?

Saudade de você
Seu riso, seu sério, seu tudo
Invadem meu ser.

Lágrimas irmãs.

Lá fora noite de luar.
Cá dentro,
Solidão.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Executiva


Executiva
Walnize Carvalho


Não abre a janela.
O dia amanhece
E não saúda o sol.

Não abre o livro.
O fim da tarde chega
E a varanda vazia.

Não abre a gaveta.
Lá bem guardadas
As fotos de infância.

Não abre o sorriso
Nem troca idéias
Com a vizinha.

Só abre o armário
Para se vestir
Apressada.

Só abre a garagem
Para
Sair com o carro blindado.

Só abre a agenda
Para
Conferir compromissos.

Anoitece.
Fecha
As pálpebras
E só...
Adormece.

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Banalização

Walnize Carvalho


No bangue-bangue da Vida/ é preciso .../ desarmar corações empedernidos/ combater atos preconcebidos/ distribuir balas de puro mel/ limpar da boca amargo fel/ desconsiderar algo sem relevância/ desatar nós de ignorância/ cultuar a fraternidade/ defender a liberdade/ desfraldar sorrisos ao vento/ viver o fugaz momento/ decorar um poema bonito/ desprender de enfadonho rito/ desmistificar que é “dono da verdade”/ soltar “a criança” em qualquer idade/ reverenciar o sonhador/ acreditar no Amor/ desenraizar a amargura/ exercitar a ternura/ conservar a calma/ desenferrujar a alma ...
E
armar-se de boa dose de ânimo/ para enfrentar a batalha do cotidiano.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Sem par


Walnize Carvalho

Se incomoda
Com o latido
Do cachorro do vizinho.

Se incomoda
Com o miado
Do gato no telhado.

Se incomoda
Com o som do carro
Que passa na rua.

Se incomoda
Com o ruído do brinquedo
Da criança na calçada.

Se incomoda
Com as gargalhadas
Do jovem ao celular.

A noite chega.
Se acomoda no leito e fica em paz :
Ela e a solidão.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Feira de artesanato

Walnize Carvalho

A brisa matinal é um convite a caminhar pela cidade.Sigo até a praça principal, onde abriga a Feira de Artesanato.Meu olhar distraído debruça-se sobre a primeira barraca que está sendo montada .Sinto-me privilegiada por ver o show,com antecipação.

O sol vem, como refletor, iluminar os trabalhos manuais que estarão expostos naquele espetáculo.
No “palco”,em breve, se apresentarão: toalhas,caminhos de mesa, babadores, toalhinhas e mais adornos.Tudo ricamente bordado.

À frente, como criadora dos personagens –ela- a artesã solitária.

Afasto-me, torcendo pelo sucesso da apresentação

sexta-feira, 30 de julho de 2010

O escritor


Walnize Carvalho
(para meu pai Waldir Carvalho)
Todos os dias ele se refugiava na sua ilha .
Ilha da fantasia.
No escritório biblioteca, em frente à maquina de escrever , ele sonhava
Viajava por passeios que não fez ;
Via cenários que não eram seus seus ;
Promovia diálogos dos quais não participava.
Na companhia do instrumento de trabalho, ele criava
Letras,palavras e textos .
Historias que brotavam da mente e do coração .

Mais tarde,impresso em papel
O fruto da sua imaginação –o livro –

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Vocações


Walnize Carvalho

- O que você vai ser quando crescer? – perguntaram à menina do cacho dourado. E ela prontamente respondera, como aliás, por certo responderiam meninas de cabelos de franja, de rabos de cavalo, de laços de fitas, de toda uma geração igual à dela: - Professora!
E assim foi que o tempo incumbiu-se de fazê-la exercer a profissão profetizada em sua inocência dos sete anos.
Espelhada em doces lembranças como a de ir de mãos dadas para a escola com a mestra que era sua vizinha, ou a de brincar de professora com primos que vinham do interior (com direito a “ditado” e “redação”) sentira que fora boa mestra nos alguns anos que estivera em sala de aula.
O grupo escolar em distrito a vinte e dois quilômetros da cidade, por lá estivera em dias de sol, em dias de chuva e até grávida dos dois filhos sem nunca faltar à doce missão...
Depois várias vocações surgiram em seu caminho: dublê de mãe, de dona de casa, de avó, de contadora de histórias, de poeta...
Com o tempo passando notara que o bom exercício delas, se devia ao fato de que se tornara mais aluna do que educadora.
E, em dias de reflexão, revendo no currículo o campo “habilidades profissionais” percebera que a na Escola da Vida não havia sido reprovada na matéria Boa Vontade e uma forte constatação: sempre tivera VOCAÇÃO para a FELICIDADE.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Busca

Walnize  Carvalho
Eu busco um sorriso
Sorriso puro
Que não seja um riso só.

Eu busco um canto
Um canto igual
Canto de paz.

Eu busco no Tempo
meu tempo
Sem tempo de voltar.

Eu busco um olhar
Olhar criança
Olhar esperança.

Eu busco o AMOR
O Igual
A Paz
E muito mais!

Eu busco um céu
Onde brilhem estrelas
De todas as cores
De todas as luzes
De todas as raças
E que reunidas
Só tenha o tom:
IGUALDADE.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Resgate

Walnize Carvalho

Acordou com vontade de trazê-la de volta.Nem que fosse por algumas horas.
Levantou-se da cama.Cabelos em desalinho.Lençóis com as marcas do seu corpo (deixaria tudo para acertar depois)
Procurou no guarda-roupa um vestido branco, próprio para o dia de primavera com ares de verão.
Enquanto amarrava o laço de fita na cintura (ele tinha um laço de fita cor de rosa) lembrou-se que em criança tinha um anel de chapinha.
Nele impressas as iniciais do seu nome.
Lembrou-se também da caixinha em que guardava o mesmo: caixa de veludo azul, onde apertando ficavam as marcas dos dedos.
Saiu à rua com a idéia bailando em sua mente: “vontade de trazê-la de volta...”
Seguiu até a feira do Mercado Municipal.
Comprou uma cesta de cajus fresquinhos.
Trouxe para casa. Na cestinha (achava linda, sentiu-se a própria chapeuzinho vermelho)...
Entrou.
Foi à pia.Lavou algumas frutas.Como uma menina levada sentou-se no umbral da porta da cozinha.
Saboreou os cajus displicentemente.
No vestido branco, as nódoas trouxeram afinal, a sua infância devolta.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Marcas


Walnize Carvalho

Desligou a tevê.
Dirigiu-se ao quarto. Precisava achar o sono, pois tinha compromisso marcado, bem cedo, para o dia seguinte.
Tirava a maquiagem olhando-se no espelho. As marcas do tempo estavam lá, em sua face.
Desfez-se dos trajes e acessórios para usar roupas de dormir.
Correu os olhos pelo corpo: as marcas do maiô, do relógio, da aliança, da vacina tomada em criança, das cirurgias feitas, da correntinha de ouro.Elas estavam lá, bem visíveis.
Sentiu-se como se tivesse sido tatuada pelo o tempo.
Cerrou os olhos. Mergulhou no seu íntimo. E viu lá no fundo do seu coração as marcas patenteadas, mas invisíveis.
Fez o sinal da cruz. Tentou dormir, pois a hora marcada para o compromisso do dia seguinte era cedo: sete da manhã.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Foto mensagem



Foto Walnize Carvalho

Mesmo com todos os percalços a flor amarela representa brasilidade em tempos de Copa do mundo.

domingo, 13 de junho de 2010

Procissão


Hoje é dia de Santo Antônio, um dos santos mais populares do país.
Com fama de casamenteiro a festa do santo dá inicício às festas populares de junho, quando cada bairro tem seu arraial, com comida típica,bebidas e música folclórica.
Hoje fomos surpreendidas aqui em casa com fogos de artifício, era uma procissão de Santo Antônio que passava aqui pela rua. Andores enfeitados, anjinhos, mas pouca gente seguindo., acho que poucos sabiam que haveria uma aqui no bairro.
A grande festa do santo acontece nos arredores da igreja do mesmo nome, mas por ser muito popular muitos outros bairros fazem o cortejo.
Pena não ter feito uma foto, de uma tradição que muitos ainda preservam e impedem que morra.

sábado, 12 de junho de 2010

Mormaço


Peço desculpas pelo atraso. A Walnize me mandou o texto desde quinta-feira e eu na correria e no meio de um gripe que resolveu não me largar acabei por postar só agora.

Mormaço
Walnize Carvalho
(pelo Dia dos Namorados)


Quando o Amor
passa
é
como um dia
de
Mormaço.
Você se distrai
Esquece
O chapéu o protetor solar.
A brisa é fresca,
A manhã é bela
Você se deixa envolver...
Percebe
ao fim do dia
o corpo
febril
tatuado
intocável.
Abre a janela
E pede
A brisa da noite
Que sopre
Pela sua pele nua
E
Suavize
o
ardor
da
Paixão.

sábado, 5 de junho de 2010

Alma em transbordamento

Florbela

Sonhar, viver em transbordamento.

Menina,

É preciso cuidar-se.

Prepare seu mundo em silêncio,

Arrume sua casa sem alarde,

Cuide do que é seu com reservas,

Sorria de felicidade, não gargalhe,

Cultive suas flores com zelo,

Espalhe suas sementes no jardim

Deixe que as raízes

Agarrem-se ao solo devagar,

Quieta no silêncio particular,

Traga para o seu sonho em noite alta,

O canto de sua alma a transbordar...


Postado no Todos os Sonhos de Abril em agosto de 2008

quinta-feira, 3 de junho de 2010

A dor que sai no jornal




Indagação ou Indignação ?
(poema inspirado em fato lido em jornal)

Walnize Carvalho
Teve que na infância brincar dentro de casa.
Não correr calçadas.
Não tirar calçados.

Teve que na adolescência sufocar
amor e desejo latentes.
Não se dar em plenitude.

Teve que casar-se menina.
Usar trajes de senhora.
Amar com disciplina.
Criar filhos.
Brincar de boneca com a filha nos braços.

Teve que ser adulta.

Mulher madura,
Foi insultada,
Ultrajada,
Traída
E assassinada.
Pagou com a própria vida
a submissão
Valeu a pena
Tanto
TER?
E pouco
SER?

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Texto de outros tempos

Quando eu estava no fim da adolescência, no início da faculdade, os textos do Artur da Távola me acompanhavam por toda parte (eu era daquelas que estava sempre com um livro dentro da bolsa ou embaixo do braço).
Eu tinha uma memória de elefante, e como sempre adorei reler os textos que me agradam chegava a saber muitos de cor. O tempo passou e minha memória já não é das melhores, mas sempre fui boa em reconhecer estilos de escrita e saber se um texto foi modificado,com excertos que não são originais.
Hoje fiquei com saudade de um texto muito conhecido do autor "Ser jovem",como meus livros foram TODOS perdidos ou emprestei e não devolveram fui recorrer ao Google. Os primeiros sites traziam o texto,mas eu li identifiquei pedaços fora de ordem ou trechos que pareciam ter sido escritos por outra pessoa. Minha memória afinal não está assim tão ruim e ainda sou capaz de reconhecer que ali não estava a escrita do cronista que tanto gostava.
Enfim encontrei o texto na íntegra.Ali do jeitinho que eu lembrava,me trouxe emoções da época, de um tempo em que a escrita e a leitura andavam juntinhas e jorravam com tanta facilidade e entusiasmo,



“ SER JOVEM”
(Arthur da Távola)

“ Ser jovem é não perder o encanto e o susto de qualquer espera. É, sobretudo, não ficar fixado nos padrões da própria formação.
Ser jovem é ter abertura para o novo na mesma medida do respeito ao imutável. É acreditar um pouco na imortalidade da vida, é querer a festa, o jogo, a brincadeira, a lua, o impossível, o distante. Ser jovem é ser bêbado de infinitos que terminam logo ali. É só pensar na morte de vez em quando. É não saber de nada e poder tudo.
Ser jovem é ainda acordar, pelo menos de vez em quando, assobiando uma canção, antes mesmo de escovar os dentes. Ser jovem é não dar bola para o síndico mas reconhecer que ele está na sua. É achar graça do riso, ter pena dos tristes e ficar ao lado das crianças.
Ser jovem é estar sempre aprendendo inglês, é gostar de cor, xarope, gengibre e pastel de padaria. Ser jovem é não ter azia , é gostar de dormir e crer na mudança; é meter o dedo no bolo e lamber o glacê. É cantar fora do tom, mastigar depressa e engolir devagar a fala do avô. É gostar da barca da Cantareira, carro velho e roupa sem amargura. É bater papo com a baiana, curtir o ônibus e detestar meia marrom.
Ser jovem é beber curvas, ter estranhas, súbitas e inexplicáveis atrações. É temer o testemunho, detestar os solenes, duvidar das palavras. Ser jovem é não acreditar no que está pensando exceto se o pensamento permanecer depois. É saber sorrir e alimentar secreta simpatia pelos crentes que cantam na praça em semicírculo, Bíblia na mão, sonho no coração. É gostar de ler e tentar silêncios quase impossíveis. É acreditar no dia novo como obra de Deus. É ser metafísica sem ter metafísica. É curtir trem, alface fresquinha, cheiro de hortelã. É gostar até de talco.
Ser jovem é ter ódio de cachimbo, de bala jujuba, de manipulação, de ser usado. Ser jovem é ser capaz de compreender a tia, de entender o reclamo da empregada e apoiar seu atraso. Ser jovem é continuar gostando de deitar na grama. É gostar de beijo, de pele, de olho. Ser jovem é não perder o hábito de se encabular. É ir para ser apresentado ( já conhece fulano) morrendo de medo. Ser jovem é permanecer descobrindo. É querer ir a lua ou conhecer as Finlândias, Escócias e praias adivinhadas. É sentir cheiro de férias, cheiro de mãe chegando em casa em dia de chuva, cheiro de festa, aipim, camisa novaou toalha lá do clube.
Ser jovem é andar confiante como quem salta, se possível, de mãos dadas com o ar. É ter coragem de nascer a cada dia e embrulhar as fossas no celofane do não faz mal. É acreditar em frases, pessoas, mitos, forças, sons, é crer no que não vale a pena mas ai da vida se não fosse isso. É descobrir um belo que não conta. É recear as revelações e ir para casa com gosto do seu silêncio amargo ou agridoce. Ser jovem é ter a capacidade do perdão e andar com os olhos cheios de capim cheiroso. É ter tédios passageiros, é amar a vida, é ter uma palavra de compreensão. Ser jovem é lembrar pouco da infância por não precisar fazê-lo para suportar a vida. Ser jovem é ser capaz de anestesias salvadoras. Ser jovem é misturar tudo isso com a idade que se tenha , trinta, quarenta, cinqüenta, sessenta, setenta ou dezenove. É sempre abrir a porta com emoção. É esperar dos outros o que ainda não desistiu de querer. Ser jovem é viver em estado de fundo musical, de superprodução da Metro. É abraçar esquinas, mundos, espaços, luzes, flores, livros, discos, cachorros e a menininha com um profundo, aberto e incomensurável abraço feito de festa, cocada preta, dentes brancos e dedos tímidos, todos prontos para os desencontros da vida. Com uma profunda e permanente vontade de SER.

Se eu voltasse a ser criança

Walnize Carvalho

Ah!

Se eu voltasse a ser criança

A criança de verdade que fui...

Se este sonho

Se tornasse realidade.

Sentir a infância.

Voltar no tempo...

Viver

Novamente

Um mundo de sonhos

_sonhos dourados

Com bonecas

De pano

De louça...

Viver novamente

Um mundo à parte

Todo meu

Inteiramente meu...

Um mundo

Que não pode ser:

Trocado

Roubado

Muito menos vendido

Porque

As fadas

Os dragões

E Cinderelas

Não têm preço.