sábado, 29 de janeiro de 2011

Mergulhos no mar da memória


Walnize Carvalho

Verão de infância distante.
A cena aparece límpida perante meus olhos : eu, primos e irmãs ( após café da manhã) trocávamos rapidamente os trajes de dormir pelos de banho de mar.E nem consultávamos o tempo! O importante era não perder tempo...embora ficássemos de guarda até que um adulto chegasse (ou melhor apontasse na esquina) para que –enfileirados- tal atletas em competição, corrêssemos para nados e mergulhos.E não havia disputa e nem espera de medalhas...Éramos,tão somente ,crianças felizes e despreocupadas curtindo férias na praia do Farol de São Tomé.
Com chuva ou com sol (de preferência por dias ensolarados, para que os adultos –os tomadores de conta- ficassem menos extenuados ) lá estávamos nós, no nosso “compromisso” diário.
E ficava difícil - mães e tias - conterem a fúria (não do mar bravio) mas de nosso impulsivo destemor naquelas horas de genuína felicidade.
Sob as barracas, (em cadeiras ou esteirinhas) os adultos admiravam o balé quase que sincronizado da criançada. Os meninos davam braçadas, “pegavam jacaré” com os braços esticados (ainda não existiam pranchas), deslizavam em meio as ondas indo até à beira mar, o que fazia com que muitas vezes “atropelassem” os que por ali estavam . Já as meninas se esmeravam em mergulhos e mais mergulhos...o que fez com que eu recebesse o título de “tainha”(tainha - um peixinho- não confundir com rainha ) do saudoso tio Zé...
A saída das águas só se dava após insistentes acenos e gritos dos mais velhos ou quando eles entravam no mar e exigiam nossa retirada.
Em tempos atuais tenho pelo mar (principalmente, o da praia campista e lugar escolhido de férias das netas) admiração e respeito. Gosto de postar-me à sua frente e meditar. É como estivesse em um santuário a ouvir cantos gregorianos que são substituídos pela melodia do bater de suas ondas.
Perante gigantesca beleza extraio lições de sabedoria para um viver harmonioso: ora mergulho fundo em busca de soluções para os desafios; ora mergulho raso quando assumo minhas limitações.
Embarco, para melhor definição, nos versos da canção: “A vida vem em ondas, como o mar /num indo e vindo infinitos” .

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Farol de muitos faróis


Walnize Carvalho
Gosto de estar por aqui neste exílio voluntário, pés no chão, despojada, encontro diário comigo mesma. Caminhar na hora do sol nascente por entre as alas de casuarinas sentindo a brisa matinal.
Ir à beira-mar, pisar na areia úmida, catar conchinhas (ainda que escassas) e sentir a maresia lamber-me a face.
Ver, ao longe, barcos no porto. Alguns de pintura nova, nomes gravados no dorso e outros já cansados, emborcados e envelhecidos pelo tempo.
Seguir em frente e observar algumas casas com telhados à mostra, enormes varandas, flores no muro espiando a rua. Em seus quintais, galinhas e pintos ciscando a terra.
Sentar-me, tomar água de coco, ver passar antigos e novos moradores. Padeiro de bicicleta, caminhão vendendo redes, kombi com legumes e frutas, o menino do picolé: - Cremoso!! É da Boa Vista!...
Ao meio-dia ir a algum dos quioques enfileirados na calçada paralela ao mar e saborear peixes e camarões fritos na hora acompanhados do largo sorriso dos que estão ali prontos a servir os visitantes.
Fazer a sesta, ler um bom livro na rede ao som de música suave.
À tardinha passear pelo Calçadão, assistir ao vôlei enquanto pessoas sentadas nos bancos ficam por ali, conversando.
Olhar em direção ao mar e ver meninos soltando pipas, moços com pranchas e senhores com redes de pescar lançando-as nas ondas bravias.
Quando a noite chega, admirar o velho Farol – timoneiro dos navegantes – e símbolo deste aprazível balneário derramar seus raios como a abençoar moradores e veranistas.
Fitar o céu salpicado de estrelas.
E em contrição com a Natureza, recolher-me, dormir e sonhar.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Ilhada no shopping



Walnize Carvalho

Estava , a mulher, naquela tarde de sábado lendo jornais.
Deu uma espreguiçada e levantou-se.
Olhou pela janela do apartamento e viu a romaria que passava rumo ao shopping .
Decidiu juntar-se aos mortais (a tarde ensolarada era um convite) e para lá seguiu também.
Entre espiar vitrines, ver pessoas, tomar sorvete e refrescar-se pelos corredores ( ar refrigerado em alta voltagem) nem viu o tempo passar.
De repente,se deu conta de que chovia lá fora.Chuva de fins de tarde em dias de verão.
Dirigiu-se até a saída .Ela e a multidão.
A cena presenciada por todos era desalentadora : ruas às escuras,alagadas.Correnteza.Rios de lama...e a constatação: estava ilhada.Ilhada em um shopping..
Alguns “sobreviventes” acionavam seus celulares enquanto outros, como ela, resolveram evadir o local.
Saiu.Atravessou as ruas rezando para escapar dos ralos entupidos por dejetos da “civilização”.
Chegou sã e salva ao apartamento.
Aliviada ,de corpo e alma lavados, suspirou: _Porto seguro! Enquanto subia ofegante os seis andares de escada.Faltava luz no prédio...

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Mormaço


Mormaço
Walnize Carvalho

Quando o Amor passa é como um dia de Mormaço.Você se distrai.Esquece o chapéu,o protetor solar.
A brisa é fresca... a manhã é bela ...você se deixa envolver.Só percebe ao fim do dia
o corpo febril, tatuado, intocável...
Abre a janela e pede a brisa da noite que sopre por sua pele nua e suavize
o ardor da Paixão.