sábado, 29 de junho de 2013

Conflito

Conflito
                           Walnize Carvalho

Degrau da escada de madeira
                                               desgastado.
Piso da fila do banco
                                  arranhado.
Roupa do varredor de rua
                                  desbotada.
Placa do sinal de trânsito
                                         pichada.
Brinquedo do jardim da praça
                                                 destruído.
Palavra do político
                                        surrada.

Na humanidade:

Solidariedade
                      envelhecida.
Esperança
               perdida.
Sorriso

         GASTO.

terça-feira, 23 de abril de 2013

De feriados e comemorações

Walnize Carvalho
          Observadora que sou do meu entorno (e é este o papel do cronista) naquela manhã percebi um certo ar de desalento na fala do moço, que estava na minha frente,na fila da padaria.
Dizia ele para o amigo que o acompanhava: - Rapaz, que chato! O feriado de Tiradentes cai em um domingo! Ao que o outro retrucou:- Bobagem! E precisa que haja feriado ou alguma data comemorativa, para você fazer seu sagrado churrasquinho de fim de semana?
         O primeiro buscando argumento finalizou o papo:- É que se fosse numa quinta “enforcaria” a sexta e de quebra viriam o sábado e domingo...
          A atendente do caixa que a tudo ouvia, retrucou: - Na próxima terça é feriado em homenagem ao glorioso São Jorge! Mas o freguês já havia saído e não escutou.
       Chegou a minha vez de pagar o pão e segui para casa desembrulhando lembranças.
Voltei no tempo e sentei-me no banco escolar. Escutava, atentamente, as explicações da professora: “O dia 21 de abril é feriado nacional. Trata-se de uma homenagem que o Brasil presta ao sacrifício de Joaquim José da Silva Xavier, que foi enforcado e esquartejado, a 21 de abril de 1792, devido a seu envolvimento com a Inconfidência Mineira - um dos primeiros movimentos organizados pelos habitantes do território brasileiro, no sentido de conseguir a independência do país em relação a Portugal.”...
E a mestra prosseguia nos preenchendo de ensinamentos, que nos faziam sentir orgulho por nossos heróis, como também motivados a chegarmos à nossa casa e dividir a lição com os familiares, no momento, em que a família se reunia à mesa à hora das refeições.
       Aí se dava a partilha do pão e do aprendizado, pois era o motivo de se alongar a conversa.
Numa verdadeira troca de experiências, nossos pais se orgulhavam de nosso interesse em aprender e nós - filhos - aquietávamos e, atentamente, ouvíamos os que eles tinham a ensinar e também acrescentar...
- Lembrança da boa! balbuciei, ao abrir o portão de casa.
  Minutos depois, a neta que passava, de mãos dadas com o pai, em direção à banca de jornais e a padaria veio ao meu encontro.
Sorriso banguela (dois dentes de leite “caíram” na semana passada) e eu, lhe perguntei: - Você sabe quem foi Tiradentes?... E ela me respondeu cheia de certeza, do “alto” dos seus sete anos: - Sei sim, vó! Ele foi um dentista que virou herói e completou: - Mas não é herói de novela, nem de revistinha não!...
        A abracei, cheia de ternura, e finalizei: - Você tá certa!!!Agora vamos pra mesa do café... Acabei de chegar da padaria e trouxe aqueles pãezinhos de queijo saborosos de que você tanto gosta!...
Ah!... Termino a crônica com um aviso aos interessados: 1º de maio é feriado nacional e caiu numa quarta-feira. Um bom motivo para lembrar e festejar, afinal, o trabalhador merece descanso. E quanto ao significado desta data ser “Dia do Trabalho”... Bom! Fica pra outra vez a explicação!

sábado, 30 de março de 2013

Verdadeiramente Páscoa

      (para Valentina)
   
Walnize Carvalho
 
  Chegou à minha casa como um presente. Presente oportuno, já que veio em pleno período da Quaresma, dando oportunidade de refletir sobre a vida nova - a Páscoa - que se aproximava. Aparentava ser de tenra idade.
 Era frágil, silenciosa, dócil, ainda que um pouco assustada.
De pele alvinha, trazia no pescoço um laçarote lilás fazendo com que a neta, em estado de tremenda euforia, exclamasse: _Que fofa!... E Fofa passou a ser o seu nome.
  As primeiras providências foram tomadas para a hóspede: um cantinho aconchegante para se instalar, água, alimentação e até brinquedo...
Em todas as manhãs, desde a sua chegada, a menininha - como boa anfitriã - a levava para dar um passeio pelo pequeno quintal, pela varanda e próximo à jardineira, que fica na frente da casa.
Sempre com o devido cuidado de manter o portão fechado, para que a “amiga” em seus saltitos, não ganhasse a rua, pois bem sabia(o pai a alertara), que ela não conseguiria se defender, caso um gato ou cachorro dela se aproximassem.
  Percebia-se que adorava passar aquele tempo: solta, brincando e pulando .
A menina se divertia em ficar olhando suas proezas e, vez por outra, lhe oferecia colo, mas ela tratava logo de se esquivar, pois gostava de sua liberdade...
Assim, as manhãs tornaram-se prazerosas, já que propiciavam à menina, exposição diária ao sol e contato permanente com a natureza ...
Na hora da refeição era uma festa!
A garota fazia questão de ajudar no preparo do alimento: cenoura (o prato preferido), brócolis, chicória, couve, alface e como complemento, fatias de maçã ou de banana.
Também não deixava faltar ração, que contém fibras, proteínas e cálcio e mantém a dieta equilibrada. Tudo isso veio estimular à garota a se alimentar de forma mais saudável, passando a ter no seu cardápio frutas e legumes regularmente...
Impressionante como aquela presença miúda e singela veio mobilizar, não só a criança da casa, como os adultos também.
 Ela virou motivo de conversas à mesa ( há quanto tempo a família se reunia às refeições?) ; de disputa saudável (-Quem acordar primeiro vai ajeitar seu cantinho!) e outros gestos fraternos!...
Os dias passando e ela, ao que parece, veio para ficar.
 E que bom, pois por causa dela, ficaram em segundo plano as “obrigações” materiais de presentes caros e de consumo exagerado de chocolates .
Agora é hora de “sair da toca” e identificar quem chegou à minha casa como um presente: uma coelhinha.
Reitero, de forma oportuna, pois além ser um dos símbolos mais marcantes da Páscoa, trouxe consigo Alegria, Renovação de hábitos, Harmonia e Nova vida a todos da casa, que passaram a tê-la como companhia...

sábado, 9 de março de 2013

Uma rosa em segredo


Walnize Carvalho

A mulher passava pela rua quando deparou com uma manifestação popular. Bem diferente de gritos exaltados havia cantoria que se misturava com orações, palavras afetuosas e...distribuição de rosas.
Rosas vermelhas.
Timidamente, aproximou-se do grupo e se deu conta que se tratava da comemoração do “Dia internacional da Mulher”.
Ficou por ali calada e emocionada quando um dos manifestantes aproximou-se dela e lhe entregou uma rosa.
Rosa vermelha.
Ruborizada, mas feliz fez o trajeto de casa carregando o mimo nas mãos como quem carrega algo precioso e frágil.
 E era frágil.
 Era uma rosa.
 Uma rosa vermelha.
 E era preciosa, pois não se recorda dia algum em que levava em mãos oferta tão significativa. Visivelmente envaidecida, aspirava de minuto a minuto o belo presente.
Quase chegando à casa, uma dúvida misturada com angústia povoaram seu pensamento: Como abrir a porta da sala e deparar com seu marido ( que por certo estaria lendo os jornais) com a rosa vermelha vistosa e perfumada, sem que ele a olhasse com espanto e a enchesse de perguntas quebrando todo o encantamento?
Preferiu entrar pela portas dos fundos e no quartinho dos fundos acomodou “sua menina” no primeiro recipiente que encontrou.
Buscou água para regá-la e dia após dia cumpria o prazeroso ritual de ir visitá-la para inebriar-se com o seu perfume...
Até que ,numa manhã, o marido anunciou viagem de negócios.
A mulher correu a um só fôlego para o cômodo onde trazia prisioneira, a rosa.
A rosa vermelha.
Planejava colocá-la numa jarra bem bonita no centro da mesa da sala onde ela iria, afinal, exalar sua fragrância reinando absoluta sem pudor e questionamento.
O que encontrou foi sua rosa desfalecida, despetalada .
Com lágrima nos olhos recolheu as pétalas já não mais vermelhas (em tom rubi )e levemente ressecadas, mas que ainda exalava um pouco do perfume do “primeiro encontro”.
Buscou um livro na estante e nele depositou as fragmentos de ternura.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Ressaca



Walnize Carvalho

Hic! Um soluço interminável, um peso enorme na cabeça (como se pousasse sobre ela um elefante), um gosto amargo na boca – gosto de cabo de guarda-chuva, dizem alguns -, náusea, mal estar, “estômago embrulhado” e o olhar distante fixado em lugar algum.
  Sabem de quem estou falando? Da famosa ressaca que nesta quarta- feira a muitos abate. Estranhamente reconheço que tenho quase todos os sintomas citados, embora não ingira bebida alcoólica nem tão pouco tenha participado da festa.
Sou tomada de uma leve prostração, de desalento, de incômodo, e também com o olhar distante fixado em lugar algum ,constato que também estou de ressaca, mas de uma ressaca atípica.
 Sinto no ar o esgotamento de valores duradouros e autênticos, uma falsa euforia, uma vontade de que a fantasia não desbote e a que máscara fixe no rosto e não descole tão cedo.
Há o cansaço do “ser eu mesmo” e o desejo de que o personagem construído assuma o papel principal.
Neste estado letárgico não há receitas caseiras do tipo: muita água de coco, sal de frutas, banho de mar e até os conselhos de “tomar mais uma”, um engov antes... outro depois, que irão modificar o quadro. E nem tão pouco vá se desfazer com vãs filosofias.
No mais, é esperar que ela se dilua por si mesma.
 E que ao fim de alguns dias se possa abrir o armário, pendurar a fantasia e buscar vestimentas adornadas de bom senso, otimismo, sobriedade e esperança.
Assim vestida, finalmente, dar início à caminhada do ano novo que nos espera.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Marolas


Walnize Carvalho

É manhãzinha.
À beira mar observo as marolas. O ir e vir das ondinhas parece um balé sincronizado da Natureza. Uma sensação nostálgica e ao mesmo tempo prazerosa me invade.
  Constato que uma coisa é viajar no imaginário, entrar no túnel do tempo e resgatar lembranças; outra é voltar ao velho cenário e sentir na pele, olhos e coração o passado-presente.
É que retorno em mais um verão à casa da infância e adolescência.
 A presença das netas(Giulia,Clara e Valentina) me fazem rever “tudo de novo” com ares saudosistas. Bom estar com elas, que curtem férias no lugar onde, em tempos idos, também desfrutei do descanso escolar. Que, aliás, de descanso não tinha e nem tem nada, uma vez que haja fôlego para aguentar e muita energia para gastar.
 Agora, na plateia, estou na primeira fila assistindo e aplaudindo as meninas. Gestos largos e alegria incontida... É o teatro da Vida.
  Surgem novas amizades.
  Não faltam disputas no espelho, troca de roupa a toda hora, cochichos e gargalhadas confrontando-se a cada minuto.
Como também idas e vindas ao vôlei, à sorveteria e à casa de amigas.
  E tome festa improvisada, mesada acabada e a grana que você dá sempre um jeitinho de arrumar para compra de algo novo que aparece, pois elas vêm em seu socorro, sem querer importunar os pais. Sem contar com as perguntas que interrompem a sua leitura na rede: - Vó! Fiquei bem com este vestido? A sandália está combinando?
E as reclamações que atrapalham a sua sesta: - Meu cabelo está uma droga! Meu biquíni ainda não secou!
A gente tenta esboçar sentimento: “Vamos conversar um pouco?” ou cercar-se de argumento: “Tome um leite ou um suco!”.
Mas, elas saem em disparada, pois não têm tempo a perder.
  Retornam da caminhada no Calçadão e comunicam: - Já comemos uns sandubas no quiosque com as amigas (estas cujos pais brincavam outrora com meus filhos).
Trocam as roupas molhadas e decretam: - Vamos assistir DVD na casa de uma colega.
  Só me resta ficar ali, mergulhada em meus pensamentos, buscando no tempo, meu tempo, sem tempo de voltar...
 Logo brotam um sorriso no canto de minha boca e uma lágrima furtiva em meus olhos.
Ao longe, o barulho do mar me atrai.
Atendo ao chamamento e vou ao seu encontro.
  Na areia, pés descalços posto-me em frente ao majestoso gigante e bendigo a dádiva de ainda estar por aqui para saudá-lo mais uma vez!

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Ano Novo


É Tempo...Já não é sem tempo

Walnize Carvalho

É tempo...
De comemoração.
De despedir-se
de mais um ano que se foi
 e renovar pedidos.

Já não é sem tempo...
  De reflexão.
De dar boas-vindas ao ano
 que chega e agradecer conquistas.

É tempo...
De encontrar amigos
e festejar este momento sublime.

Já não é sem tempo...
De ir ao encontro de si mesmo
e celebrar a cada instante o dom da vida.

É tempo...
De ofertar presente
como prova de amizade.

Já não é sem tempo...
De ser presente na vida do próximo
exercitando a qualquer tempo a solidariedade.

É tempo...
De arrumar e faxinar gavetas.

Já não é sem tempo...
De abrir a mente
e dar uma limpeza geral
 nos seus conceitos e preconceitos.

  É tempo...
  De rasgar papéis entulhados e desnecessários.

Já não é sem tempo...
De arrancar folhas de rancor, intolerância e desamor
do seu caderno de anotações.

É tempo...
De adquirir uma agenda nova
  e ficar ansioso por anotar compromissos.

Já não é sem tempo...
De olhar as páginas em branco da nova agenda
e refletir sobre o mistério dos dias que virão.

É tempo... De abrir janelas para ver o tempo lá fora
e torcer para que a estação traga dias ensolarados.

Já não é sem tempo...
  De escancarar as portas dos sentimentos
e olhar seu “tempo interno”
agradecendo a chuva (seus momentos de introspecção)
ou o sol (seus momentos de alegria).

  É tempo... De recomeço
e já não é sem tempo
de reconhecer
que todo recomeço traz em sua bagagem
um perene exercício de aprendizagem

É tempo... Já não é sem tempo.