sábado, 3 de abril de 2010

História da princesa moura e do dragão azul


História da princesa moura e do dragão azul, (in Textos e cartas de Pedro Paixão a Helena Águas 1985-1986)

Esta é a história de uma princesa moura das terras quentes do sul
e de um dragão azul - que era afinal um príncipe
das terras altas do norte

Andava a princesa desaustinada, numa noite de temporal
e absolut vodka, num reino que ficava equidistante.
(Ela não sabia do que andava à procura.)
Entrou na sua carruagem puxada por noventa cavalos e tinha apenas percorrido alguns metros quando se lhe atravessou no caminho um jovem dragão azul com figura de príncipe, molhado como um pinto por causa da chuva que caía muito forte. Ela parou, baixou o vidro da carruagem, e ele quis saber que música vinha ela a ouvir e para onde ia ela àquela hora da madrugada.

Logo aí a moura percebeu que era um dragão azul das terras altas do norte que lhe falava a sorrir, e foi sem ela se dar conta que ele a raptou, convidando-a para sua casa...
Ainda se perderam, porque o belo dragão ainda não sabia de cor o caminho de casa.
Mas a princesa deixou-se levar até ao castelo, feliz por acreditar que o dragão não lhe iria fazer mal - quem sabe seria um príncipe? (Parecia mesmo um príncipe que ela já tinha visto num filme!...)

Encontraram-se numa noite de temporal
entre o norte e o sul
e foi ela que o guiou
sem saber que estava a ser raptada

Quando chegaram ao castelo o príncipe abriu a porta devagar e entraram os dois pé ante pé, pois todos se encontravam já a dormir.
Os aposentos continuavam mergulhados na penumbra da madrugada e a princesa moura ficou a saber que no castelo não havia luz nem água, e por isso foi preciso acender uma vela.
Conversaram de música e cinema durante um bocadinho, mas o dragão dentro do príncipe começou a beijar a moura, que estava cheia de medo.
(Não é todos os dias que uma moura é raptada por um dragão azul das terras altas do norte!...)
E cheia de medo ela se foi entregando devagarinho até deixar de ser princesa, para se transformar numa sereia nos braços do belo príncipe...
Abraçaram-se muito, beijaram-se muito, mas ela temia que o dragão fosse apenas mais um sapo, e lá se ia protegendo como podia, dando muito mas não tudo.
Queria sossegá-lo, ao príncipe, mas o dragão não queria sossegar...

E foi preciso muito carinho e ternura e paciência para adormecer o príncipe e o dragão dentro dele...

Depois a sereia procurou peça a peça as suas roupas espalhadas pelo chão e foi-se vestindo devagar e sem barulho, para não o acordar.
Ela apagou a vela, tapou o príncipe adormecido e beijou-o docemente na face. Ele sorriu, sem abrir os olhos.
E a moura disse "Até logo".
Encantada.

L.A.
Coimbra, 1998

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