sexta-feira, 8 de julho de 2011

A menina no cinema


Walnize Carvalho

Foi só ela entrar no cinema para que se transformasse.
As cadeiras acolchoadas e aconchegantes (verdadeiro colo) e mais a trilha sonora a transportaram. Abrindo o saco de pipocas – pensou – sem disfarçar o sorriso: - Estou deixando lá fora a pessoa adulta que sou e me encontrando com a “minha” menina.
. Bem posicionada deixou que os olhos se fixassem na tela. Nem pestanejava. Colocava pipocas na boca com avidez e displicência deixando algumas caírem sobre seu colo.
Aos poucos, embalada pela magia da história, foi se distanciando de si mesma.
Era tempo de férias.Férias de julho. Havia crianças e jovens barulhentos à sua volta. Ela não os escutava. Também estava de férias: férias “daquela” que deixou lá fora.
Alguém pediu (pela terceira vez, talvez) licença para passar e sentar-se na mesma fileira.
- Hã!?..., pois não, pode passar! – respondeu de forma automática.
E por minutos se dispersou da cena e pensou “naquela” que ficou do outro lado da sala de projeção.
Suspirou. – Coitada, tão cheia de compromissos, tão cheia de contas a pagar, tão cheia de problemas para solucionar, tão submersa em ocupações e horários, tão... tão.... robotizada!
Em certas ocasiões tão cruel se olhando no espelho e questionando: - Já viu suas rugas na testa? – Reparou nos seus cabelos embranquiçados? – Poxa! Você engordou, heim!? E a mais terrível das provocações: - Não vê que você não é mais uma menina!...
Mexeu-se na poltrona e balbuciou: - Não! Aqui neste momento “ela” não irá me abater.
Tentou ver o filme. Mas de novo cenas legendadas passaram diante do seus olhos: “a outra” até tem certa razão, afinal, ser responsável, cumpridora de suas obrigações não é papel fácil de se representar.
Novamente o pensamento contraditório: mas tanta disciplina todo tempo? Todo dia? Toda vida? Definitivamente, não! – deixou escapar em voz semi-alta.
Afinal, ela precisa fugir um pouco dos compromissos; dar asas à imaginação; ser feliz sem hora marcada e, acima de tudo, eliminar a culpa. Assim, de repente, no meio da tarde estar no cinema desfrutando o direito de ser criança.

2 comentários:

Ana Paula Motta disse...

Ah os cinemas da infância, lembro das sessões no velho Goitacá que quando saíamos nos espantávamos por ser ainda dia claro, já que lá dentro da sala enorme nos distraíamos e esquecíamos do tempo lá fora.

walnize carvalho disse...

É amiga!...
São lembranças tatuadas em nossos corações!