sexta-feira, 26 de agosto de 2011

A inquieta


Walnize carvalho


Ela não me dá sossego.

Por sua causa
Atravesso ruas sem ver sinal luminoso
Entro no banho de relógio no pulso
Dou boa noite em pleno meio dia.

Por sua causa
O café esfria na xícara
Perco o sono
Ganho peso.

Por sua causa
Rabiscos palavras desconexas
esquecida dos óculos
sobre a mesa.

Por sua causa
Rego plantas conversando
Ouço pássaros
fazendo dueto com eles.

Por sua causa
Falo
Rio
Choro sozinha.

É uma criança inquieta,
que só dá trégua
Quando a coloco
no lugar que mais almeja - o papel
Ela: a Poesia.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Alívio



Walnize Carvalho

Chegara apressada a casa.
Mal tivera tempo de abrir a porta e...calçados pro ar!
Correra em busca de algo que para ela seria de extrema necessidade.
Viera, há poucos minutos atrás, pela rua distraída e ansiosa . Nem vira a vizinha com seu “boa tarde”costumeiro.Trazia nas mãos, flores colhidas na calçada.
Chegara realmente apressada.
Estaria em busca de um copo d’agua para matar a sede, já que o sol forte da tarde de primavera com ares de verão ainda brilhava no céu?
Estaria à caça de um analgésico para uma eventual dor de cabeça, pois o dia de trabalho fora exaustivo?
Estaria necessitada de farta refeição,pois estivera tão atarefada que não tivera nem tempo de lanchar?
Não. Como uma criança travessa que sobe na cadeira em busca de guloseimas dentro do armário ela dirigiu-se à cozinha preparou um chá, ajeitou na bandeja, com biscoitinhos e uma jarra miúda onde colocou as flores.
Abriu o computador.Com a setinha (que para ela era mágica) clicou no site preferido.
Lá encontrou a poesia ,que bem sabia, iria aliviar a sua alma.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Anéis e alianças


Walnize Carvalho

Passo pela sala. A tevê está sintonizada em um telejornal. No canal, as notícias são levadas ao telespectador através da fala do locutor e de legendas ao pé da tela.
Detenho o passo apressado e leio com curiosidade: “Sonda descobre mais dois anéis de Saturno”.
A cabeça gira no tempo e logo a figura do professor de Ciências dos idos do ginásio (não me recordo o seu nome) aparece aos meus olhos. Ele e a explicação detalhada: “Os anéis de Saturno são constituídos de mistura de gelo, poeira e material rochoso”. E seguia: “Os maiores anéis possuem nomes próprios”...
Reorganizo as idéias e saio à rua. Meu destino é a empresa de telefonia local.
Chego ao majestoso prédio azul, que fica na confluência das ruas Treze de Maio com Formosa, cheia de papéis e perguntas.
Reflito. Haverá alguém para dar-me a informação de que preciso? Afinal, são tempos “on line” e, por certo, não encontrarei cabines, sorridentes telefonistas, listas telefônicas e nem filas de espera.
Abro a porta de vidro fumê. Entro no ambiente de ar refrigerado e computadores. O segurança (homem alto, forte, meio sorriso e terno escuro) após minha indagação aponta-me a sala em frente.
Dirijo-me à atendente. O ar frio do recinto não a contamina, pois o atendimento, além de pessoal, é complementado de calor humano e de dados precisos.
Débora (é este o nome que está no crachá) – a solícita funcionária – explica-me a possibilidade de união em “um só pacote das telefonias fixa, celular e o uso da Internet”.
Casamento perfeito, pensei.
Ao entregar-me o protocolo de atendimento meu olhar fixa em suas mãos. O dedo anelar esquerdo ostenta uma aliança larga e dourada. Em suas unhas esmaltadas destacam-se minúsculos brilhos como fossem estrelinhas.
E, novamente, a fala mansa do mestre ecoa em meus ouvidos: “Como no velho ditado, onde há fumaça há fogo, em Saturno se há um anel possivelmente há uma lua”.
Deixo o prédio.
Retorno à rua meio atônita, “no mundo da lua”, pois inúmeros afazeres me aguardam no decorrer do dia.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Em tempo de festa do Padroeiro...


Coração em festa

Walnize Carvalho

O mês de agosto que chega.
O resgate de um agosto qualquer da remota juventude atravessou o dia. Dia de sexta.
Na memória, a ansiedade com que eu aguardava a chegada dos primos, que vinham do interior para a festa do padroeiro da cidade. Vinham na véspera do grande dia.
Como que fazendo contraponto com as batidas do meu coração, o relógio de parede da casa da vizinha batia tão alto e sempre às horas certas.
Um grito amigo ecoava na porta da casa: - Bota água do feijão! Era o código que a família (tios e primos) acabara de chegar.
Na bagagem, além de roupas e calçados novos, traziam doces caseiros (ainda quentinhos) em compoteira amarrada por toalha de saco alvinha e bordada com o dia da semana: SÁBADO. Cuidadosamente, o recipiente era guardado na cristaleira de casa para “depois do almoço” – sentenciavam os adultos.
E grande era a pressa de almoçar, saborear a sobremesa e, principalmente, passar o restante da tarde conversando, rindo e nos preparativos para o dia seguinte.
Seis de agosto. Seis da matina.
Éramos acordados com o sino de igreja distante. Saltávamos da cama e disputávamos o lugar na fila do banheiro para, após o café matinal participarmos de quase todos os eventos da Festa do Santíssimo Salvador.
E tudo começava pela manhã.
Primeira parada: Corrida de bicicletas onde assistíamos em frente ao“Balalaica” na Alberto Torres, aos velozes atletas. Em seguida, nosso destino era a Beira Rio para apreciarmos as Regatas. O remo ( um dos mais tradicionais esportes de nossa cidade) era um espetáculo à parte.
Retornávamos à casa para o almoço,um breve descanso e esperar que os adultos avisassem que poderíamos nos arrumar para o “segundo tempo” da Alegria.
Era tardinha. E lá íamos nós, rumo às festividades.
Nós, meninas, de saias plissadas, casacos com golas de lã, sapatos de saltinho “Luiz XV” e batom “Labatte” nos lábios. Nos olhos, um brilho de felicidade.
Como na parte da manhã, íamos a pé e de mãos dadas. O eco de nossas gargalhadas felizes corria pelas ruas como o vento sul que sempre se fazia presente nesta ocasião do ano.
Caminhávamos da Rua do Gaz até a Rua Sete. E nesta, a parada dos adultos para olharem as vitrines enfeitadas era obrigatória: calçados na Almeida, louças no Dragão, tecidos na Imparcial, o que aumentava a impaciência da meninada ávida em alcançar a praça.
Como a chegar em um oásis, avistávamos as torres da Catedral. Com sacos de pipocas à mão (os meninos com cataventos de papel e bandeirinha nacional) postávamos em frente ao templo para observar o encontro de amigos, ouvir as bandas de música, aguardar a procissão, extasiar com a apresentação da Esquadrilha da Fumaça sobre o Rio Paraíba e admirar a tão esperada queima de fogos.
Era a festa. Festa do Santíssimo Salvador. Festa do padroeiro da cidade.
E são estas fatias de ingênua felicidade que vieram dar sabor às minhas lembranças neste agosto de 2011.